Destaques

Os melhores discos internacionais de 2023

Este foi um ano no qual as opções dos escribas Altamont mais se dividiram, já que batemos o recorde de discos nomeados para o top final – 117 discos diferentes apareceram na soma das listas individuais. Mostra isto que houve poucos discos consensuais e unânimes, daqueles que eventualmente ficarão para recordação em anos futuros.

Falando em recordação, importa trazer para cima da mesa a nostalgia que será a nota dominante que levamos de 2023 – houve música nova de Beatles e Rolling Stones (no caso dos Beatles, sabendo como a mesma foi “concebida”, será nostalgia do passado ou um vislumbre do futuro?), os Lemon Twigs encarregaram-se de nos fazer sentir nos sixties, os Nation of Language nos early eighties, Lana del Rey mostra laivos de poder assumir-se como a verdadeira herdeira de Joni Mitchell (heresia?), os Blur fizeram-nos sentir nos nineties, a instituição que são os Yo La Tengo lançaram um álbum que muito dignifica a sua longa carreira de 40 anos.

Muito revivalismo portanto, e pouco espaço para primeiros discos de bandas novas, sendo os únicos nesta “categoria” os Bar Italia e os Feeble Little Horse. No espectro do jazz dois grandes discos, o póstumo de Jaimie Branch e o excelente trabalho de Yussef Dayes com Black Classical Music.

Olhando para o topo da classificação, tudo podia portanto acontecer, e entre o excelente regresso de King Krule, o túnel melancólico de Lana del Rey, a superbanda boygenius e o nosso estimado Sufjan Stevens, intrometeu-se a brasileira Ana Frango Elétrico para agitar as águas. Quem terá saído vencedor no fim? Só um scroll vos dirá.

Obrigado por terem estado aí, o Altamont voltará em 2024 para mais discos, audições, crónicas, reportagens, playlist, Rádio Clube Altamont e sessões Caos no Sodré!



20. feeble little horse
Girl With Fish

“Já não há heróis da guitarra”, dizia McCartney em 2017. Mas se “nada se perde, tudo se transforma”, como dizia Lavoisier no século XVIII, isso não é verdade. Da revolução digital nasceram novas formas de rock — das quais os feeble little horse são filhos. Ao segundo disco, Girl With a Fish, a banda de Pittsburgh constrói imponentes muralhas de som shoegaze suavizadas pela voz delicodoce de Lydia Slocum.


19. Yussef Dayes
Black Classical Music

O nome foi ganho pelo Sul de Londres, onde o barrete, colorido e sempre bem enterrado na cabeça se fez famoso, bem antes da chegada do seu primeiro disco como chefe de banda, Black Classical Music. Davies sentou-se na bateria com apenas 4 anos e passados 26 apresenta jazz na sua melhor forma. Nem por isso fácil de catalogar, mas puro na sua misturada, do bom, do que um dia poderá chegar a clássico.


18. Nation of Language
Strange Disciple

Em apenas 10 canções e 44 minutos os Nation of Language conseguem apresentar um álbum coeso, com ajuda essencial na produção de Nick Millhiser que aparece também responsável por alguns sintetizadores e baterias e é parte integrante de que este disco soe tão bem. Ao contrário do que canta Devaney na última música (“I will never, I will never learn”), estes nova-iorquinos aprendem e bem, a fazer cada vez melhor.


17. The Lemon Twigs
Everything Harmony

Everything Harmony, como bem anuncia o título, oferece-nos cinquenta minutos de uma enternecedora e satisfatória gama de harmonias. Os “irmãos limão”, neste seu mais recente projeto, redescobrem novas atmosferas sonoras em torno de técnicas herdadas dos seus “avós” (Fleetwood Mac, Joni Mitchell, Simon, Garfunkel e companhias), devolvendo uma beleza chorada pelo mundo da música a uma distância de quase meio século.


16. bar italia
Tracey Denim

Um trio britânico com nome de canção de Pulp, os bar Itália tiram mais inspiração aos 90’s depressivos e lo-fi. O álbum de canções curtas tem muito fuzz nas guitarras, vozes calmas e sempre a atirar para um shoegazezinho.
Se são fãs desta onda, com vozes estilo Robert Smith, canções sobre desamores e guitarras com fuzz, vão encontrar aqui um dos álbuns do ano.


15. Caroline Polacheck
Desire, I Want To Turn Into You

Ao segundo disco lançado em nome próprio, Caroline Polachek torna-se o ícone pop que sempre quis ser. Desire, I Want to Turn Into You é o culminar de uma transformação que começou há uma década atrás. Quem sabe para onde Caroline Polachek nos levará na sua próxima metamorfose.


14. Youth Lagoon
Heaven Is A Junkyard

O quarto disco de Youth Lagoon, Heaven Is A Junkyard, junta melodias viciantes a uma perturbadora melancolia. A produção é espaçosa e orgânica, de um irrepreensível bom gosto. A sua voz, antes distorcida com baldes de reverb, está agora ao natural, trémula e andrógina mas verdadeira, sofrida e rugosa mas sem quaisquer truques. Os timbres acústicos dominam, a começar pelo seu piano dolente, e até a ocasional manipulação electrónica sabe a coisa pura e viva.


13. Jungle
Volcano

Volcano, o quarto disco de Jungle, volta a piscar o olho às pistas de dança, com faixas orelhudas como “Holding On”. Este é um trabalho com fortes influências do funk e disco dos anos 70 mas em versão revista, mais limpa e estilizada. Bem produzido, com algumas colaborações interessantes, sendo consistente do início ao fim. Talvez lhe falte um pouco de alma ou de alguma música que verdadeiramente se destaque mas talvez não faça diferença quando resultado do todo é tão satisfatório.


12. Joanna Sternberg
I’ve Got Me

Considerada uma das revelações da música em 2019, a cantautora e multi-instrumentista nova-iorquina Joanna Sternberg editou, em 2023, I’ve Got Me, o seu segundo disco. Este é um lançamento em forma de “one-woman-album” – onde a artista interpreta todos os instrumentos do seu disco (guitarra, piano, violoncelo, violino, entre outros) e até assina a capa do álbum.


11. Sergio Díaz de Rojas
Muerte en una tarde de verano

Muerte en una tarde de verano é um disco conceptual, um exercício em que de Rojas nos conduz pela sua própria vida no dia em que lhe calhou morrer. É por isso que começamos por “Amanecer (Prefacio)” e terminamos, ao anoitecer, à beira do mar e do fim, em “Atardecer a orillas del mar”. Este é um disco para mentes que precisam de espaço e de respiração, neste mundo acelerado e atribulado. Uma dose de beleza que tanta falta nos faz.


10. Unknown Mortal Orchestra
V

Depois de saborearem o sucesso trazido por Sex & Food, os Unknown Mortal Orchestra exploram novas formas de fazer música. Para os fãs que apreciem discos mais consistentes e focados a nível conceptual, V será talvez um disco sem direção e o presságio do eventual declínio. Para quem aprecia o lado mais esotérico dos UMO este disco será, sem dúvida, uma revelação.


9. Mitski
The Land Is Inhospitable And So Are We

This Land Is Inhospitable and So Are We é um projeto, refinado tanto na lírica como na música, que vem mostrar ao mundo uma Mitski sem papas na língua. As letras que este compreende são de uma transbordante honestidade frontal, sem rodeios, acompanhadas de uma delicadeza musical um tanto cómica, por vezes.


8. Jaimie Branch
Fly or Die Fly or Die Fly or Die (World War)

Quem nos dera poder falar deste disco sem ter que utilizar o palavrão póstumo. Quem nos dera não termos de nos lamentar do mais do que prematuro desaparecimento de Jaimie Branch e de apenas podermos sonhar com o que viria a seguir. Quem nos dera que a conjunção do título “Fly or Die” não nos tivesse traído, porque a verdade é que se há coisa que esta obra nos faz é pairar sobre uma paisagem sónica composta por pinceladas fortes de tons apenas aparentemente contrastantes de free jazz delirante, punk de combate, country suado e ferrugento, eletrónica celestial e ritmos cajun e tatuada pelas vocalizações de Jamie! Don’t forget to fight!


7. Yo La Tengo
This Stupid World

This Stupid World, décimo sétimo (inserir emoji com cabeça a explodir) disco de estúdio da banda, é mais do mesmo dirão muitos, enquanto outros tantos rejubilarão com essa informação. O portentoso trio constituído pelos sessentões Georgia Hubley e Ira Kaplan e pelo caçula James McNew está aí para as curvas, lançando mais um álbum incrível que o mundo não ouvirá. Mundo estúpido, portanto, este.


6. Lana Del Rey
Did You Know That There’s a Tunnel Under Ocean Blvd

Glamour, romance, melancolia, nostalgia, doçura e esperança invadem a melodia experimental deste álbum. Eve Babitz escreveu: “Women want to be loved like roses. (…) They want to haunt.” É com a mesma doçura e agressividade que Lana nos prende ao botão de repeat.


5. King Krule
Space Heavy

Para se fazer um disco como Space Heavy deve ser necessária muita disciplina. Há aqui muito detalhe, muita precisão, ordem e contensão, grande esforço para se conseguir um disco dotado de inteligência e sensibilidade próprias. E isso, convenhamos, é muito difícil de acontecer. Para mais, essa intelectualidade sonora é-nos oferecida da forma mais apetecível, bela e inusitada. Space Heavy é coisa rara, celestial e inusitada. Toda a sua deliciosa estranheza vem de um lugar indizível onde habita um rapaz de nome King Krule.


4. Blur
The Ballad of Darren

The Ballad of Darren é o novo álbum de uma banda que percebeu o seu tempo e o seu percurso. É o disco de conforto dos Blur. Como se percebe, The Ballad of Darren, mesmo que nunca o ouvíssemos, estaria destinado ao triunfo. Ouvindo-o, e dedicando-lhe a atenção merecida, o regozijo é óbvio. É o disco mais curto de toda a discografia da banda, o que poderá bem ser mais um sinal de maturidade.


3. Ana Frango Elétrico
Me Chama De Gato Que Eu Sou Sua

Já sabíamos que Ana Frango Elétrico era um talento raro na canção brasileira. Ei-la, agora, num glorioso balanço, livre, leve e solta, a maestrina mais sofisticada da ginga-pop atlântica, a fazer da transa e do desejo matérias-prima de uma música explosivamente colorida.


2. boygenius
the record

O novo disco das três amigas superou as expetativas já que os três estilos distintos destas integrantes complementam-se tão bem ao ponto de não termos certeza se é uma canção de Bridgers, Dacus ou Baker. Isto porque elas conseguiram que boygenius fosse mais que a soma das partes e formasse um grupo a sério, com outra identidade. Aqui as temos então, com um disco daqueles para ser ouvido muitas vezes.


1. Sufjan Stevens
Javelin

Javelin serve quase como um sumário do que Sufjan fez desde 2006. O banjo dos discos iniciais continua a perder protagonismo, mas não se perdeu a inventividade melódica que já ficara bem vincada em Seven Swans. Há elementos de grandiosidade, como em Illinois, experimentação como a de The Age of Adz e vulnerabilidade como a de Carrie and Lowell. Foi preciso esperar oito anos por um digno sucessor, mas ele está aí. Javelin mostra Sufjan em todo o seu esplendor de sofredor capaz de fazer grandes canções.

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