Destaques

Os melhores discos nacionais de 2023

Fomos sentindo e comentando entre nós que estava a ser (mais) um bom ano de música portuguesa, e, olhando para o top que apresentamos abaixo, não há qualquer dúvida que assim foi. De entre os 20 contribuidores para o veredicto final, saíram 64 discos diferentes que limitámos aos vinte mais votados.

Entre nomes consagrados como Mão Morta, Legendary Tigerman, Jorge Palma e Luís Varatojo com os seus Luta Livre, apareceram estreias que nos conquistaram, como os casos de Veenho, Ana Lua Caiano, Margarida Campelo ou Expresso Transatlântico. Houve, como sempre, espaço para o hip hop com o regresso aos álbuns de Slow J, Chullage e Conjunto Corona, tal como obras mais inventivas e intrigantes – Dispirited Spirits, Pedro Ricardo, Máximo e Eugénia Contente Trio. Temos Maro como cabeça de cartaz feminina no nosso “festival” e o projecto Acácia Maior a representar a nossa ligação umbilical a África.

Por fim, e como não podia deixar de ser, o bom e velho rock, carregado pelos Zarco, Cave Story e, em lugar de destaque absoluto, os Glockenwise, com Gótico Português, a encabeçar a lista.

Viva 2023, viva a música nacional!

Alexandre Pires



20. Mão Morta + Pedro Sousa
Tricot

Dos Mão Morta esperamos tudo. Em 2023, juntaram-se ao saxofonista Pedro Sousa, figura da música mais exploratória. O resultado é Tricot, disco de vistas largas que dá novos mundos ao sistema espacial que é a carreira da banda de Braga. Um tricotado de excelência, meio caminho entre o rock e o free jazz.


19. Acácia Maior
Cimbron Celeste

Cimbron Celeste é África em terra lusa, é sincretismo musical, música do mundo e para todo o mundo que goste dos trópicos da vida. Tem “Grandeza”, tem “cultura do povo”, tem encanto e ginga suficientes para nos fazer mexer as pernas, o corpo todo, a cabeça em estrelas de outro continente, mas também no nosso. É uma bela manta de sons tecida com os fios dourados do sol, tão boa que apetece ouvir Acácia Maior no frio europeu.


18. Dispirited Spirits
The Redshift Blues

Projeto do português Indigo Dias, inspirado pela vastidão do espaço, Redshift Blues é um daqueles discos que nos faz acreditar no futuro da música feita em Portugal. Com semelhanças a Placebo, Car Seat Headrest ou coisas mais math rock como American Football, Indigo Dias cria o seu caminho e som neste trabalho. Um artista que merece muito mais reconhecimento no nosso panorama musical, pelo DIY e, sobretudo, pelos resultados.


17. The Legendary Tigerman
ZEITGEIST

Ao sétimo álbum, Paulo Furtado usou Paris como David Bowie se serviu de Berlim nos anos 70. O músico português refugiou-se durante uma temporada alargada, no final de 2019, naquela cidade, para explorar uma nova identidade sónica que concretizasse o seu crescente fascínio pelos sintetizadores e o permitisse seguir em frente, sem repisar as mesmas fórmulas. Um novo caminho musical para se manter vivo e relevante.


16. Luta Livre
Defesa Pessoal

Dois anos depois do disco de estreia, a Luta Livre, de Luís Varatojo, volta à carga com um álbum ainda mais directo que o anterior e mais próximo do formato canção. Em Defesa Pessoal, cada música é uma vinheta dos problemas modernos da nossa sociedade: o magro salário, a falta de habitação acessível, a luta de classes (com os mesmos de sempre a ganhar), a desigualdade ou a tensão social.


15. Conjunto Corona
ESTILVS MISTICVS

ESTILVS MISTICVS, o sexto álbum do Conjunto Corona, foge ao estilo mais festivo-latino do anterior G de Gandim e embrenha-se a fundo na noite do hip-hop horrorcore. Histórias de bruxaria, misticismo, feitiçarias e superstições, tudo regado com aquele humor nortenho que é a imagem de marca do grupo. Este é um disco nocturno, mais pesado mas cheio de grandes malhas que entram para a galeria de melhores temas deste conjunto.


14. MARO
hortelã

Três guitarras acústicas e uma voz quente fazem hortelã, um álbum de honestidade bruta e de conclusões para novos começos. Nas dez faixas que o compõem, MARO transforma a dor em poemas que carregam tanto de vulnerabilidade como de encanto. Entre confissões inseguras e insónias de um coração partido, lutas interiores e devoção, a sonoridade do disco é coesa e familiar, enquanto inova na maior simplicidade.


13. VEENHO
Lofizera

Primeiro álbum da banda lisboeta, Lofizera chega-nos depois de seis anos de singles e EPs esparsos, e causa estrondo. As suas influências são evidentes, mas todas assinaláveis – de uns Pavement a Wavves, com toques óbvios de punk quanto mais não seja pela rapidez das canções, os Veenho levam-nos por entre as suas guitarras carregadas de distorção e um slackerismo constante na voz, de quem faz isto por falta de melhor que fazer. Tudo isto é ruído, tudo isto é melodia, saudamos Lofizera como belo disco que é.


12. Eugénia Contente Trio
Duckontente

Este não é um disco de jazz clássico, nem redondinho nem avant-garde, nem um trabalho que só os apreciadores de jazz podem gostar. É sobretudo uma celebração da música como arte de prazer, de pica. E pica este Duckontente tem para dar e vender. Eugénia tem razões para estar contente e muito caminho pela frente. Quando explorar toda a música que lhe está no sangue, continuaremos a ter frutos bons, por largos e felizes anos.


11. Prétu
Prétu 1 – Xei di Kor

Prétu é a nova persona de Chullage e veículo para expressar uma revolta imensa. Misturando sons cabo verdianos e de outras latitudes africanas com o rap e o rock, Nuno Santos solta o seu grito sem amarras. “Só p’á avisar que nada vai ficar retido na minha laringe”. Ficamos avisados.


10. Pedro Ricardo
Soprem Bons Ventos

Soprem Bons Ventos é o disco de estreia do multi instrumentista Pedro Ricardo. Neste álbum, o também produtor e DJ, funde jazz, electrónica e música tradicional portuguesa com uma toada muito atmosférica, nostálgica mas, ao mesmo tempo, vibrante e moderna. Uma viagem instrumental onde todas as influências são mais do que soma das sua partes.


9. Máximo
Greatest Hits

Greatest Hits é um excelente disco de estreia, do jovem Máximo Francisco, em que o piano nos conforta e transporta para lugares distantes e para dentro de nós próprios. Um trabalho em que o silêncio é tão importante como as notas, e cuja inventividade melódica nos transporta para bandas-sonoras imaginadas, desde o recato do quarto a lugares mais exóticos.


8. Ana Lua Caiano
Se Dançar é Só Depois

Em Se Dançar É só Depois encontramos nas canções uma aliança perfeita entre o moderno e o tradicional, onde os ingredientes são a música eletrónica e a música tradicional portuguesa, uma continuação do que já tinha sido feito no trabalho anterior, embora a identidade visual deste último EP nos catapulte ainda mais para o tradicional. Apesar de ser lisboeta, a dinâmica anda à volta de um imaginário minhoto onde o folclore é um dos elementos encontrados.


7. Slow J
Afro Fado

A vida entre duas realidades. Ser de um lado e do outro mas, ao mesmo tempo, não ser de nenhum. Se há coisa que Afro Fado nos diz – entre muitas outras -, é que o seu talentoso autor, Slow J, é um homem dividido. O rapper e produtor setubalense fala com sinceridade, olha-nos nos olhos e comunica com a abertura de quem não pertence a nenhuma facção (apenas àquela que a sua inteligência cria) e só quer existir sem ter de ser ou preto ou branco, ou fadista ou rapper.


6. Cave Story
Wide Wall, Tree Tall

Wide Wall, Tree Tall é o regresso do conjunto das Caldas da Rainha aos discos, depois de um hiato de 5 anos. Afastando-se ligeiramente da onda mais apunkalhada DIY de Punk Academics, a banda apresenta agora um belíssimo conjunto de canções curtas e diretas, cheias de guitarras soalheiras e com um sentido de humor cáustico, que demostram que o grupo está mais refinada e mais crescida.


5. Zarco
Não Lembra ao Diabo

Não Lembra ao Diabo soa diferente porque a banda está diferente, mas mantém o espírito agregador e o amor de sempre nas composições originais e magistralmente tocadas. Os Zarco perderam um amigo e, por isso, perderam uma parte de si. Mas ganharam coragem para voltar, em bom, como seria a única forma certa de o fazer, fazendo jus ao seu legado. Um belíssimo regresso que dificilmente parará de ecoar pelo espaço e pelo tempo.


4. Margarida Campelo
Supermarket Joy

O primeiro disco a solo de Margarida Campelo é uma espécie de visita de amigos de longa data. Tudo soa estranhamente familiar e é reconfortante. Com Supermarket Joy, Margarida Campelo tem o lugar no centro do palco e o mais estranho é que apenas 15 anos depois de ser uma voz conceituada no panorama nacional tenha tido a sua estreia à frente de um projeto musical. Pelo menos é uma estreia em grande.


3. Jorge Palma
VIDA

VIDA é um disco de grande beleza e qualidade.  E podemos dizer, por brincadeira, que merecia uma melhor capa. No entanto, quando o colocamos a tocar, o esquecimento dessa imagem é imediato, e o que fica é mais uma vez a declaração de um dos nossos poucos génios na arte de criar instantes, instantes a que chamamos canções. Canções que, como bem sabemos há muito, são para todas as nossas vidas.


2. Expresso Transatlântico
Ressaca Bailada

Foram rápidos. Chegaram e impuseram-se de forma quase imediata. Aos poucos, vão-se tornando um caso sério da arte de bem fazer boa música. Há quem olhe para eles como os novos Dead Combo, mas dão pelo nome de Expresso Transatlântico. O seu primeiro LP é um rápido, mas contagiante abraço às raízes lusas e ao mundo que os lusos, noutros tempos, conheceram e que agora revisitam.


1. Glockenwise
Gótico Português

O quinto disco dos Glockenwise continua a toada indie de Plástico, mas agora com um maior arrojo experimental. A portugalidade de Gótico Português não é a maior surpresa do álbum, longe disso. É a sua sensibilidade menos imediatista que sobressai, com temas mais longos e estruturas mais complicadas, que exigem mais investimento do ouvinte, ganhando a banda muitos pontos pela ousadia formal, crescendo a cada nova audição. Mais uma belíssima rodela dos minhotos.

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