Os blues não se fazem de pressas. Basta a receita a tradicional. Não são precisos truques, sprints pelo braço, loops, autotunes ou outros demónios. Bastam “seis cordas carregadas”, explica Buddy Guy no single de “Born To Play The Guitar”. Um dos discos do ano.
Com quase 80 anos, uns trinta discos e uma tonelada de prémios, podia ter gravado um disco de duetos a puxar ao sunset, anunciar reedições ou, simplesmente, ficar sossegado. Buddy Guy podia tudo. Até podia ter recorrido aos truques. Afinal, foi ele quem mostrou a Hendrix que a guitarra se tocava com os dentes e até por trás das costas. Mas também é a ele quem Clapton entrega o título de “melhor guitarrista vivo”. Como poucos, Buddy Guy podia fazer tudo. Até um disco perfeito de blues.
A lista de convidados é curta. Joss Stone, Billy Gibbons, Kim Wilson e, a ajudar na despedida a BB King, Van Morrison. A lista de truques ainda é mais reduzida – Buddy Guy e a Fender 54′ a que dedica “Wear you Out”. Em Born To Play The Guitar há riffs de fazer corar honestas bandas de rock e guitarra em dose suficiente para derreter os corações dos groupies dos blues. Também não há exageros. E em catorze músicas, duas destacam-se – “Too Late” e “Crazy World” que podiam ter sido gravadas por Gary Moore. As restantes, ficam na divisão do ‘não mexe que estraga’.
Se os blues não se fazem de pressas ou de grandes epifanias, de que se fazem? Sobrevivem apenas à custa do riff mais contagiante do mundo? Vudu? Estou enganado e restamos doze fãs de BB King, Howlin Wolf, Ray Charles e companhia? Será do ‘Mojo’ de que Muddy Waters tanto se gabava? Seja o que for, Buddy Guy conhece-lhe os segredos.
Em “Come Back Muddy”, reclama saudades dos tempos de “fazer barulho e beber vinho” com a primeira das superestrelas. Em “Backup Mama” mostra que até as traições podem ser tocadas com classe e em “Whiskey, Beer and Wine” deixa a receita para tudo o que se precisa numa boa festa. “Em Smarter Than I Was”, ouve-se Jack White e “Turn Me Wild” – onde nem falta uma discreta homenagem à “Red House” de Hendrix – podia servir de Bíblia para a rising star, Gary Clark Jr.
A lenda diz que foi Muddy Waters quem impediu que, por fome, Buddy Guy desistisse dos blues. Outra, garante que o próprio Hoochie Coochie Man lhe pediu para que, depois da sua morte, mantivesse os blues vivos. Com um disco em que a classe na guitarra chega a roçar a piada, em que nem falta um piano tão discreto como certeiro ou a ocasional ajuda de um secção de metais, Buddy Guy não dá sinais de ser homem para deixar promessas por cumprir. O Guardian diz que a guitarra continua “incendiária”, o suficiente para que 2015 já tenha mais um grande disco.