Como resposta ao sexo, drogas e rock’n’roll, vieram os beijos, coca-cola e doo-wop das Ronettes. Nunca a inocência soube tão bem.
O rock’n’roll dos anos 50 foi uma pedrada no charco. Era de tal forma rebelde e lascivo que gerou um pânico mediático. Não havia pai de família que dormisse descansado. Mas no final da década Deus ouviu as preces das mães aflitas: Elvis foi para a tropa, Chuck Berry foi preso, Little Richard tornou-se pastor da Igreja, Jerry Lee Lewis caiu em desgraça, Buddy Holly caiu do avião. Foi a primeira morte do rock. A primeira de muitas.
Quem preencheu o vazio foram as girl groups, tornando-se o género dominante até à invasão britânica. Tudo na sua estética é candura e romantismo, a antítese da sensualidade selvagem do rockabilly.
No período 1963-1964, o grupo do momento são as Ronettes e o seu único álbum é o pináculo da estética girl group. As letras são pueris, declarações parvas de amor adolescente. A voz de boneca de Veronica Bennett consegue a proeza de ser inocente e marota ao mesmo tempo. Estelle e Nedra são discretas, complementando Veronica com bonitas harmonias vocais. A sua mistura de doo-wop, pop e um pezinho de soul é puro cinema: “Be My Baby” a rodar numa sonhadora jukebox; o rei e a rainha do prom a dançar “Baby, I Love You”; um beijo num cinema drive-in, tentar ir mais longe, levar um tabefe.
E, por fim, o ingrediente secreto: o famigerado “wall of sound” de Phil Spector, tornando tudo mais grandioso, Wagner para teenagers. Spector não grava instrumentos, grava a sala, o eco das paredes. Essa reverberação acrescenta sonho à exuberância e melancolia ao seu esplendor.
Com a revolução empreendida por Dylan e pelos Beatles, a estética naif das girl groups depressa se tornaria anacrónica. Mas a pop dá muitas voltas e a ironia da new wave reabilitaria mais tarde o género. Pouco importa, contudo, a forma de as olhar. Seja através da sinceridade kitsch original, seja com o distanciamento malicioso da pós-modernidade, o parecer dos ouvidos é sempre igual. O mais puro deleite.