Timeline é um dos bons projetos que a nossa geração psicadélica tem para oferecer ao futuro. Através de uma criação que é um misto de originalidade e de influências, os Mild High Club, encabeçados por Alex Brettin, construíram, no seu album de estreia, uma musicalidade própria.
Quando chegar a minha vez de ser pai, vou «atormentar» os ouvidos dos meus filhos com o álbum de estreia dos Mild High Club, Timeline, de 2015.
Gosto de fazer esse exercício – de pensar sobre que álbuns é que vou ouvir, no futuro, aos altos berros em viagens de carro com os meus filhos –, porque me faz chegar a conclusões importantes; permite-me concluir quais os projetos musicais que são, ou não, essenciais na minha vida.
Timeline é, sem dúvida alguma, um desses projetos.
Há uma certa nostalgia misteriosa no pop-psicadélico que reveste as 10 faixas deste LP. O álbum passa a correr por nós, ficando pouco tempo a descansar no interior da nossa cabeça. É intenso, porém. Talvez seja por isso que é tão viciante.
Temos de tirar o boné a Alex Brettin (ele anda sempre com o seu boné na cabeça). O músico nascido em Chicago, e que depois se fixou em Los Angeles, é o mentor de um projeto que já conta com três álbuns: o primeiro é este, “Timeline”; o segundo é “Skiptracing”, nascido em 2016, e o terceiro é “Sketches Of Brunswick East”, de 2017 (esse projeto que é, na verdade, uma colaboração com os australianos King Gizzard and The Lizard Wizard).
Comecei a escrever este texto logo após a ter escutado, pela enésima vez, o álbum. Fiquei com uma vontade de lhe dedicar umas palavras e aqui estão elas.
Timeline, para mim, é sempre mais do que um «álbum»: é uma memória que não consigo esquecer; é um pôr do sol analógico; é uma cerveja que ficou quente entre as minhas mãos; é um grupo de pessoas, de amigos, com o qual parei de conviver; é uma juventude que já não volta.
O esqueleto do álbum é constituído por 28 minutos, divididos, então, em 10 músicas.
A primeira faixa deste projeto é a “Club Intro”. É uma composição cheia de força, que ganha contornos melancólicos a partir do segundo 50’ – esses contornos, que surgem entre guitarradas, irão, de resto, acompanhar todo o restante álbum. Não devemos ignorar a bateria, sempre constante e firme, que acompanha a faixa em análise. “Club Intro” é isso mesmo: uma introdução. São três minutos que nos embalam e nos preparam para um sono profundo.
Só ouvimos a voz de Brettin na segunda canção do álbum, “Windowpane”. O psicadelismo de Timeline começa aí. Vale a pena atentar nas linhas de baixo que estruturam, notoriamente, a faixa. No entanto, o que mais impressiona o ouvinte em “Windopane” devem ser as sonoridades que, oriundas de sintetizadores, acabam por combinar, na perfeição, com as tais profundidades escavadas pelo referido baixo.
Em “Note To Self” mais guitarras. As notas iniciais que abrem a faixa transportam-nos para outro tempo – para os anos 70. Em “Note To Self” mais baixo. Em “Note To Self” mais bateria. A terceira canção é um retrato muito fiel daquilo que é o álbum em si. A faixa é manifestamente curta (tem apenas 2 minutos e 20 segundos), mas, nos nossos ouvidos, por estar envolvida num loop que não tem começo, nem fim, parece nunca acabar. Mas acaba. E assim seguimos caminho para a faixa “You and Me”.
Segue-se a “Undeniable”, registo apenas instrumental que, por isso, acaba por desempenhar a função de interlúdio. Depois, surge, redonda, nos nossos ouvidos, a faixa que dá nome ao álbum: “Timeline”. Envolvida em teclas eletrónicas, “Timeline” é uma composição cuja beleza se baseia na fragilidade da voz de Alex Brettin, que se esconde por de trás de um instrumental muito azul, leve e celestial. (Sempre que ouço este registo, nasce um dia bonito de sol e de céu azul no interior dos meus ouvidos.)
A sétima música do álbum é a mais animada do mesmo. “Rollercoaster Baby” é a faixa mais distinta do álbum, apesar de ser construída pelos mesmos materiais que cimentam a musicalidade das restantes produções do álbum. O que é diferente em “Rollercoaster Baby” é a sua aura. Nesta canção, não há melancolia, nem tristeza. Há, sim, uma sensação de calor, de juventude eterna. É a minha favorita em Timeline.
Seguem-se as faixas “Elegy”, “Weeping Willow” e “The Chat”, faixas para as quais converge, novamente, um registo melancólico, baço.
Em “Elegy”, a onda psicadélica diminui. Há mais voz – esta é, talvez, a canção «mais cantada» de todo o projeto. É também a canção mais lúcida do projeto. Nesta, vemos – melhor… ouvimos – um Alex Brettin mais limpo, mais sério, não fosse esta uma canção de amor. Em “Elegy” sentimos a presença de um piano, também ele limpo e lúcido. Aqui, o piano é importante porque, para além de ser uma novidade em Timeline, serve também de complemento à voz, e ao lamento, de Alex Brettin.
Em “Weepiling Willow” há qualquer coisa de Beatles. É verdade que é possível formar esse entendimento em momentos anteriores do álbum, mas é nesta faixa (sobretudo nos 20 segundos iniciais do mesmo) que sentimos, com maior intensidade, essa aproximação à melhor banda de todos os tempos.
E, por fim, os Mild High Club despedem-se de nós com “The Chat”. É um bom fim de álbum. A última faixa do projeto é líquida, é uma composição que, por ser leve, acalma o nosso ouvido. Há muito «Ariel Pink» nesta música (sobretudo no refrão e nos momentos que vêm depois desse momento) e isso é bom sinal. Por seguir um registo completamente diferente (assim um pop leve, digno da década de 80), entendo que se possa considerar que este trecho cumpre «mal» a sua função de trancar o álbum, mas não. “The Chat” é uma boa despedida.
Comecei a escrever este texto logo após a ter escutado, pela enésima vez, o álbum. Fiquei com uma vontade de lhe dedicar umas palavras e aqui estão elas. Espero que elas sejam fiéis àquilo que Timeline constitui.