Foi uma estreia, como tantas outras. Foi uma banda, como tantas mais. Nunca tiveram o sucesso que mereciam, por isso faz todo o sentido recordar os The Auteurs e o seu New Wave inicial.
Como tantas e tantas bandas ao longo dos tempos, os The Auteurs tiveram uma vida curta e sem grande proveito em termos de estrelato. No entanto, os quinze minutos de fama não lhes faltaram, mas foi quase e apenas isso. Tudo aconteceu num tempo em que a chamado Britpop distribuía jogo, apesar da banda de Luke Haines ser claramente uma carta mais fora do baralho do que dentro do naipe de grupos desse estilo que iam aparecendo como cogumelos. Entre azares e sortes, e depois de uma breve experiência com outro grupo (The Servants), Luke Haines e os The Auteurs tentaram a sua sorte e ela não lhes foi totalmente madrasta. Mas faltou sempre um bocadinho, um qualquer empurrão (interno ou externo) para que se fizessem tão grandes como os seus pares. Convém perceber que nesse disputado campeonato musical com vista à obtenção da pole position, surgiram nomes como Blur, Oasis, Suede, Pulp e muitos mais, todos de dentes de fora, assanhados e sedentos, prontos para a guerra dos tronos musicais. Luke Haines nunca se deu bem com essas guerrilhas (mesmo tendo lançado, alguns anos depois, um projeto paralelo de nome Baader Meinhof, se é que me fiz entender), pelo que a batalha parecia perdida desde o seu mais tenro começo. Mas a vida tem destas coisas e, por vezes, como bem sabemos, há perdedores que também triunfam. É tudo uma questão de perspetiva. A nossa, bem vistas as coisas, é a que se segue.
A moda agora (e mais uma vez) era a de bandas de guitarras, talvez pela saturação da new wave synth-pop que foi acontecendo durante toda a década de 80, embora tivessem começado a carregar em teclas e botões ainda nos finais dos anos anteriores. A apologia de um certo revivalismo british serviu também para combater o ímpeto grunge que se estendia para além das terras do Tio Sam, e assim, conjugando-se todos estes fatores, a chamada Britpop não se conteve e conquistou o mundo, ou parte dele. A cool britannia e os swinging sixties estavam na berra. No entanto, há sempre quem não se dê totalmente bem com a moda, mesmo que com um pé dentro dela. E assim, a vinte e dois de fevereiro de 1993, o mundo passou a conhecer os The Auteurs e o seu ótimo primeiro longa duração, com o irónico título New Wave. O trio de músicos, embora mereça ainda destaque o violoncelista James Banbury, que logo depois veio a tornar-se membro da banda, era composto por Luke Haines (guitarra, piano e vozes), Alice Redman (baixo) e pelo baterista Glenn Collins, que já não tocou no disco seguinte. Doze temas apenas, e ainda uma hidden track, quase atingindo os quarenta e quatro minutos de duração, diziam ao que os The Auteurs vinham. E diziam muito bem, a começar pelo single (e tema de abertura do álbum) “Show Girl”, com acordes iniciais tão blurianos que até assustam. Longe de ser o melhor tema do álbum, “Show Girl” fez o seu caminho, assim como foram fazendo alguns outros temas e, a bem dizer, o disco todo, que chegou a atingir o digno vigésimo segundo lugar do Top Britânico. Nada mal, sobretudo para quem se foi, aos poucos, apagando de álbum para álbum. Diga-se, no entanto, que os quatro LPs dos The Auteurs são todos bons. Por isso, para que possam vir a dar-lhes a atenção que julgamos bem merecida, aqui ficam para eventuais futuras audições: Now I’m a Cowboy (1994), After Murder Park (1996) e How I Learned to Love the Bootboys (1999).
E porque falávamos em boas canções, aqui vão o lote das melhores, segundo os nossos apurados critérios auditivos: “Junk Shop Clothes”, fantástica balada que deveria ter sido um hit, havendo mínimos de justiça nestas coisas da música. Mas não sendo assim, juntemos-lhe mais outras estrondosas faixas que o mundo deveria resgatar, como “Don’t Trust the Stars”, bem mais roqueira e assertiva, “How Could I Be Wrong”, cheia de personalidade e estilo, a deliciosa e algo desengonçada “Valet Parking” e ainda a intromissiva “Early Years”. Para lá das boas canções de New Wave, todas elas apareciam ligadas entre si por um estilo de escrita muito próprio e, claro, pelo génio nascente de nome Luke Haines, de quem já fizemos várias vezes menção nestas páginas.
Feita a contabilidade à passagem do tempo, New Wave completou quarenta anos há pouco mais de seis meses, e também por isso resolvemos voltar a ouvi-lo na íntegra. E que bem soou! New Wave, assim como todos os outros três álbuns dos The Auteurs podem, ainda hoje, fazer companhia a qualquer melómano que goste de boas guitarras e de boas canções. Canções especiais, quase todas elas à beira de serem gigantes, mas que não terão sido feitas para o mais alto estrelato, preferindo trocar esse eventual Olimpo por corações mais humanos, como os nossos.