O terceiro disco dos Red Hot, The Uplift Party Plan, é aquele que melhor ilustra a essência do género que inventaram: o funk metal. Uma mistura feliz entre funk, rap e rock.
O período mais inspirado dos Red Hot é o dos anos 90, talvez porque Blood Sugar Sex Magik, One Hot Minute e Californication tenham a medida certa de açúcar pop (por contraponto aos mais melosos anos 2000 e aos mais acres anos 80). O que não quer dizer que a primeira fase – a que vai do álbum homónimo até Mother’s Milk – deva ser vista como uma nota de rodapé. Pelo contrário, os nossos doidos californianos foram então responsáveis pelo nascimento de um novo e vital género – o funk metal. É de respeito.
Ora o disco que agora espreitamos é o que melhor capta essa essência funk metal. O álbum de estreia (de 1984) é encantador mas a produção de Andy Gill é demasiado gélida (como seria de esperar, aliás, quando é o mentor dos Gang of Four que está ao leme). Freaky Styley (de 1985) é outra pérola, produzida pelo próprio mestre George Clinton (Parliament, Funkadelic) mas o que ganha em calor funkadélico perde em virilidade roqueira. Os dois primeiros álbuns já tinham misturado no seu lunático caldeirão o groove do funk e o flow do hip-hop, mas faltava o terceiro ingrediente, só trazido inteiramente por The Uplift Party Plan: a agressividade eléctrica e rápida, com guitarras orgulhosamente musculadas. Cortesia do malogrado Hillel Slovak, que morreria um ano depois de uma estúpida overdose. Além do hard rock (o “metal” de “funk metal” sempre foi manifestamente exagerado), Slovak convoca o punk e o classic rock (sobretudo o Hendrix, eterno companheiro espiritual dos Red Hot).
O baixo slap de Flea, metálico e percussivo, continua no centro de tudo, mas onde antes era mais groovy do que violento, agora inverte a ordem dos factores. Estamos, portanto, bem longe do slap sensual dos Sly and the Family Stone: o baixo de Flea só tem agora um propósito: cortar cabeças com o seu gume afiado. As raízes punk dos Red Hot a virem ao de cima…
The Uplift Party Plan não só transborda de louca parvoíce à George Clinton, como espelha a sua obsessão – bem californiana – pelo corpo e pelo prazer (leia-se “sexo”; se há misoginia ou não em “Want to Party on Your Pussy” deixamos ao leitor decidir). Mas não é um disco perfeito, longe disso. A qualidade do som é manhosa e a produção é datada. O groove contagiante esmorece lá para o fim (os últimos temas são esquecíveis). Se elogiamos o balanço sincopado e a energia vibrante, não podemos deixar de lamentar o desinteresse olímpico que então nutriam por melodias coloridas e memoráveis.
Com uma flagrante excepção: a deliciosa “Behind the Sun”, de longe a canção mais interessante dos Red Hot dos anos 80. É um tema lento e lânguido (em contra-corrente com a velocidade áspera do resto do álbum), de toada psicadélica (com direito a cítaras e tudo). Não abdica do groove, bem pelo contrário, mas coloca uma melodia bonita e memorável no âmago, sob a forma despretensiosa de uma cantilena infantil (o baixo sempre a subir para notas mais graves, como quem galga umas escadas à pressa, é pura magia). Uma pequena amostra do melodismo sem filtro que viria a seguir.