Ten é uma das grandes bandeiras do grunge. Talvez o único rival à altura de Nevermind.
Há quem diga que o grunge nunca existiu, que foi um artifício dos media meter no mesmo saco bandas com linguagens tão diferentes: o classic rock dos Pearl Jam, o punk pop dos Nirvana, o falso metal dos Alice in Chains e dos Soundgarden. Dizer isso é não perceber que o grunge nunca foi uma estética mas sim uma atitude: uma reacção ao escapismo e artifício do hair metal, e uma sensibilidade genuinamente atormentada.
Nesse sentido, Ten é o momento mais grungey dos Pearl Jam, quase um álbum-conceito sobre teenage angst. Está lá tudo: o sentimento de solidão e de incompreensão, os escapes mais ou menos auto-destrutivos, e até a solução final do suicídio. Mas Ten conforta mais do que magoa. O seu sofrimento é tão épico que o adolescente que o ouve sente-se especial, orgulhoso pela sua infelicidade ser tão grandiosa. Os solos majestosos, as percussões imponentes e a voz possante dão dignidade à nossa tristeza. Através de hinos como “Alive” e “Even Flow”, a nossa melancolia, antes plebeia, ascende na escala social. Antes de Ten, estávamos na merda; depois de Ten, curtimos uma angst.
Nunca é de mais sublinhar a voz extraordinária de Eddie Vedder. Os Pearl Jam podem ter roubado muito aos Kiss e aos Who, aos Zeppelin e ao Hendrix, mas o barítono quase operático de Vedder é inteiramente original. Até Eddie aparecer, não sabíamos que era possível a um branco ser dono de uma voz tão expressiva e matizada, tão intensa e emocional. Nesse sentido, Vedder, mais do que um vocalista de hard rock, deverá ser considerado como um cantor soul, na mesma tradição de um Sam Cooke ou de um Otis Redding.
Infelizmente, a sua voz foi copiada até à náusea. Às vezes, por bons copistas como os Stone Temple Pilots. A maior parte das vezes, por aberrações como os Creed e os Nickelback. Estes sucedâneos deram mau nome a Ten mas o pobre do disco não tem culpa nenhuma do péssimo gosto dos seus imitadores.
Contam-se pelos dedos os discos em que todas as suas canções sejam capazes de figurar, sem grande embaraço, num best of. O ano mágico de 1991 trouxe dois destes discos perfeitos: Ten e Nevermind. Os críticos sempre preferiram o último, insinuando que Ten era o lado mais popularucho do grunge. Mas esta clivagem sempre foi parva – a base de fãs dos dois era essencialmente a mesma.
Que o tempo redima, por fim, o grande Ten, pondo-o ao mesmo nível de Nevermind. Ambos definiram uma época. Ambos foram estupidamente influentes. Ambos salvaram-me na minha macambúzia adolescência.
Obrigado. I’m still alive.