Chegou ao fim a edição de 2019 do NOS Alive. Com datas já agendadas para o próximo ano, a notícia da noite de ontem foi a da confirmação do regresso dos Da Weasel ao Festival. Mas isso é conversa para daqui a um ano. Cada coisa a seu tempo, e ontem houve muito para ver e ouvir.
Coube aos rapazes de Alcobaça a abertura do palco nobre do NOS Alive 2019. Com disco novo na bagagem, bilingues como sempre, os The Gift apresentaram-nos o seu Verão, mas mexeram, e bem, no vasto baú de “velharias”. Passaram pelo recente Altar e por êxitos mais antigos. Foram o que costumam ser: vigorosos, competentes, alternando os ritmos dos seus temas por momentos mais eufóricos e outros mais introspectivos. “Sometimes you gotta get up / Sometimes you gotta get down”, não é verdade? A voz de Sónia Tavares parece a mesma de há muitos anos. Só a imagem vem mudando, mas isso é parte da vida. Quem não muda no empenho com que se entregam são os The Gift, que parecem estar sempre em forma. Muita rodagem é o que dá. Ainda bem. Bom início do dia final do NOS Alive deste ano.

Depois da pop, fomos ao rock. Saltámos os nuestros hermanos Vetusta Morla (são repetentes) e fomos até ao outro extremo do recinto. Os Rolling Blackouts Coastal Fever não são de meias medidas e atiram-se às guitarras como amantes desesperados. Boas e certeiras canções rumo aos muitos corpos com vontade de dançar. O Palco Sagres estava bem composto e ninguém de lá arredou pé. Ainda com repertório curto, os RBCF tocaram praticamente todas as faixas orelhudas do seu único álbum. Via-se que estavam felizes em palco. Cá por baixo, na relva alcatifada do recinto, nós também. Foi bom.
O nome Gavin James, enquanto designação de artista, pode passar despercebido, mas a nível sonoro são várias as canções que podem facilmente ser reconhecidas. Gavin James foi uma escolha acertada para todos aqueles que apenas quiseram passar um final de tarde a ouvir canções de amor e desamor, com melodias simples mas eficazes e que, provavelmente, são portadores de corações com tendência para fortes sentimentalismos.
Dj Tourist subiu ao Palco Clubbing de óculos escuros e cara trancada, mas não foi preciso muito tempo até esboçar um sorriso, tal a entrega das pessoas que estavam à sua frente. Um concerto de música eletrónica como o de Tourist nunca tem muito por onde falhar. Os ritmos puxam a coreografias instantâneas, o que faz com que se solte uma forte energia dançante. Apesar de uns quase inaudíveis problemas de som no início do concerto, a música eletrónica complexa e ambiental que Tourist tocou, foi sempre bem recebida por todos.

O furacão Idles passou pelo Palco Sagres e não deixou nada em pé. Atitude, garra, nada lhes falta. São completamente diabólicos estes rockeiros. Tochada absoluta. Ao vivo, são irrepreensíveis e de uma enorme humildade no que dizem. Sem exageros. Honestos, como honesta é a música que fazem. Soam todas ao mesmo, mas apetece dizer “ainda bem”. Pena não terem canções verdadeiramente marcantes, exceção feita, por exemplo a “Danny Nedelko”, do recente Joy as an Act of Resistence. Uma verdadeira lição de rock. Ficámos exaustos só de os ver e ouvir.
Bon Iver entrou sereno em palco e assim permaneceu durante toda a sua atuação. Sem grandes picos de energia, mas sempre com tudo controlado ao segundo. Cada som/ sample / harmonia que ouvimos resultou da simplicidade e de beleza com que Bon Iver trabalha a sua arte. Não faltou nenhuma grande canção por cantar. Umas mais antigas e mais folk, outras mais recentes e já com a presença marcante da eletrónica. Mas o momento alto foi, claro, “Skinny Love”. Tocada apenas com guitarra e voz, mas nem esse parco recurso lhe fez perder o encanto. A utilização perfeita do vocoder, o timbre da voz de Justin Vernon, a forma particular como toca guitarra, foi tudo muito bonito e não terá desiludido quem o ouviu.
Chegámos ao palco Sagres para ver Marina, que entretanto já atuava com os seus quatro bailarinos que faziam também o coro das suas canções. E assim foi durante todo o concerto. Músicas pop com refrões dançantes e letras que ficam na memória é a única coisa que Marina sabe fazer. E quando o dizemos, não o fazemos num tom pejorativo, pois fazer boa música pop não é tarefa fácil. Apesar de afastada dos antigos Diamonds, Marina continua a dar cartas, e muitas delas são simpáticos trunfos. Ao nosso lado, alguém satisfeito dizia ter assistido a uma ótima aula de aeróbica.

A quantidade de t-shirts no recinto não dava para enganar: os Smashing Pumpkins eram provavelmente a banda mais esperada da última noite de Alive. Com o guitarrista James Iha de volta à banda, é mais fácil viajar no retropolitano até aos anos 1990: a classe dos hinos de Siamese Dream e Mellon Collie, em concreto, faz o resto. O problema está no repertório de anos mais recentes, desinspirado e recebido com global apatia pelo público. Mas pouco importou – o concerto foi ganho nos clássicos e continua a saber bem ouvir canções como “Cherub Rock” ou “1979”.
No Radio, just Head! Thom Yorke apresentou a sua pesada artilharia eletrónica no Palco Sagres. Segundos depois da meia-noite, quem quisesse ouvir o mentor dos Radiohead sabia ao que vinha. Música para a dança das cabeças. Hipnótico, como seria de esperar. Intenso. Não será para todos os gostos, mas para início de madrugada, não poderíamos desejar melhor. Com o seu parceiro e amigo Nigel Godrich, passaram em revista alguns temas dos álbuns The Eraser, Tomorrow’s Modern Boxes, Amok e Anima. Com ajuda importante de Tarik Barri nas imagens projetadas, a viagem que nos foi proposta cortou-nos, por vezes, a respiração. São lindíssimas as suas alucinadas fantasias. Enigmas sonoros de ritmo e cor. A electrónica dos tempos modernos tem aqui um compêndio de bom gosto para explorar. Magnífico!
A noite e o NOS Alive estavam por um fio, e quem o usou para dar o ponto final aos três dias de festa foram os The Chemical Brothers. Como banda para encerrar noites de grandes enchentes (o terceiro dia esgotou a lotação) não há melhor. A dupla Tom Rowlands e Ed Simons nunca falham. São ótimos para libertar o álcool em excesso. Foi bonita a festa. Foi bonita a décima terceira edição do NOS Alive!
Texto: Carlos Vila Maior Lopes e Lourenço Lopes com Pedro Primo Figueiredo || Fotografia: Inês Silva