Dois anos depois do fim oficial da banda, surge Coda, reunião de outtakes de discos anteriores, servindo para cumprir obrigações contratuais e para a despedida sem grande glória
A morte de John Bonham, em 1980, matou igualmente os Led Zeppelin. O estrondoso baterista, segundo o relatório do médico legista, sofreu “death by misadventure”, ao sufocar no seu próprio vómito enquanto dormia, depois de malhar 40 shots de vodka. Foi um fim muito rock n roll para uma banda que, durante uma década, simbolizou o próprio rock n roll.
In Through the Out Door, de 1979, estava destinado a ser o último disco dos Led Zeppelin, mas acabou por não ser assim. Essa honra acabaria por caber a Coda, editado em Novembro de 1982, quase dois anos após o anúncio oficial do fim da banda, que não podia substituir qualquer um dos seus membros sem destruir a alquimia que os tornara únicos.
Coda é, juntamente com o disco anterior, um dos álbuns malditos do grupo, considerados os mais fracos, aqueles que denotavam que os Zepp tinham esgotado o seu prazo de validade. Se em In Through the Out Door o som mudara, com os sintetizadores de John Paul Jones a reclamarem a preponderância roubada à guitarra de Page, desaparecido em combate e nas garras da heroína, em Coda o problema é outro. Aqui não há aventuras sonoras de monta, não há é também grande imaginação ou qualquer rasgo.
Coda surge por dois motivos: os Zeppelin deviam dinheiro ao fisco e tinham mais um álbum comprometido no contrato com a Atlantic Records; e o mercado de bootlegs estava a florescer desde o fim da banda, levando Page a responder com alguns temas que andavam a circular de forma não oficial, e sem qualidade de som. Por outro lado, os discos anteriores dos Led Zeppelin continuavam a vender muito bem, ajudados pelo facto de muitas bandas de metal e de hard-rock que começavam então a ter sucesso citarem os ingleses como grande influência. Dois anos depois do fim, e com o ameaçador punk já em cacos, ainda havia muito público para os Led Zeppelin.
Este último disco é, assim, uma colecção de sobras, muito mais do que um best-of. O problema é que os Led Zeppelin nunca guardaram muita coisa, e só muito mais tarde Page conseguiria ir desenterrar caixotes obscuros para as reedições de luxo dos álbuns da banda.
Dos oito temas de Coda, a primeira metade tem origem na fase “imperial” dos primeiros discos, sendo a segunda mais ilustrativa de onde a banda estava perto do fim, assentando sobretudo em sobras de In Through the Out Door. Esta foi, aliás, uma forma, póstuma, de Page regressar à banda e até a temas que tinham sido gravados com pouca participação sua. Agarrou nas músicas que tinham ficado de fora, acrescentou overdubs da sua guitarra mágica, misturou tudo de novo até à exaustão. Foi o último grito desesperado de agarrar a banda da sua vida, e um último adeus.
A primeira metade é uma homenagem às origens, começando na óptima e enérgica “We’re Gonna Groove”, que faz exactamente o que promete, com toda a banda em grande forma e o infernal Bonham em destaque. Foi gravada num concerto no Royal Albert Hall em 1970, sendo habitual no alinhamento dos concertos da banda durante muitos anos. Originalmente pensada para Led Zeppelin II, acabou por nunca ter sido gravada em estúdio. Para Coda, Page eliminou o som do público, remisturou tudo e acrescentou partes suas de guitarra. “I Can’t Quit You Baby” é o único tema de Coda que já havia sido editado, surgindo aqui numa versão diferente da do disco de estreia, tendo sido gravada no soundcheck do mesmo concerto. Estas são, talvez, as melhores músicas de todo o disco, ilustrativas da energia dos primeiros tempos da banda. A acústica “Poor Tom” foi gravada nas sessões para II, conhecendo aqui a sua primeira edição. A mexida “Walter’s Walk”, que fecha o lado A, é um outtake de Houses of the Holy, de 1973.
No lado B, dos quatro temas, três são sobras de In Through the Out Door, trabalhadas em estúdio por Page. Os destaques vão para “Bonzo’s Montreux”, na prática quatro minutos de um solo extremamente inventivo de John Bonham (e ainda trabalhado em estúdio por Page); e para “Wearing and Tearing”, acelerada como poucas músicas dos Led Zeppelin, vista como uma tentativa de apelar aos fãs do punk, tendo sido gravada no final de 1978.
Depois da morte de Bonham, no início dos anos 80, Jones retirou-se para o campo, Plant iniciou uma carreira a solo que dura até hoje, e Page foi para estúdio trabalhar nesta última mensagem da banda que fundara de raiz, no final dos anos 60. Foi nesse momento que inaugurou aquele papel de curador da memória dos Led Zeppelin, continuando actualmente a ser o grande guardião do património e da memória da banda, como se viu pelas excelentes reedições recentes.
Nos últimos temas de Coda, há sinais do que os Zepp poderiam vir a ser nos anos 80, caso tivessem durado. E não podemos dizer que isso teria feito bem ao legado da banda. Coda não é um mau disco, mas é um disco fraco para o altíssimo padrão Led Zeppelin.