Rock psicadélico calminho e simpático, bom para um final de tarde verão a descer a costa Alentejana: foi assim que o duo californiano Foxygen se mostrou, em 2013, no seu segundo álbum We Are the 21st Century Ambassadors of Peace and Magic. Durante 35 minutos, deliciaram os ouvidos de muitos com as suas doces melodias.
Em 2014, no entanto, aconteceu alguma coisa. Inverteu-se a ordem das coisas: um título curto a suportar um álbum longo. …And Star Power é um portento de uma hora e vinte e dois minutos de psicadelismo, tanto do mais doce como do mais duro de ouvir. Os ácidos e cogumelos e tudo foram muitos mais desta vez. Portanto, aqui, é natural ir-se do 8 ao 80, numa longa, alucinante e quase contínua trip. Com a ajuda de outros exploradores como Rolling Stones, The Velvet Underground, David Bowie ou The Brian Jonestown Massacre, Jonathan Rado e Sam France deixam as praias solarengas da Costa Oeste e partem em direcção ao espaço. …And Star Power é o resultado dessa viagem, desses meses de exploração do cosmos.
O álbum encontra-se dividido em quatro actos: The Hits, Star Power Suite (partes 1 e 2 do acto I), The Paranoid Side, Scream: Journey Through Hell e, finalmente, Hang on to Love. Qualquer uma descreve perfeitamente aquilo que é, estando todas muito bem sequenciadas.
Na primeira parte, encontramos as músicas mais easy listening, um bocado numa linha de continuação do álbum anterior. Aqui estão presentes os dois únicos (pelo menos, até à data) singles: «How Can You Really» e «Cosmic Vibrations». Ambas fáceis de «digerir», não deixam de ser músicas bastante bonitas, como de resto todas as músicas nesta parte. Especial destaque para «Coulda Been My Love», uma música composta por uma melodia pop bastante eficaz, que fica no ouvido, nos põe a bater o pé e a cantarolar a tristeza e a melancolia de um amor perdido.
Depois da parte «bonita», é lançado o foguetão e a viagem a sério começa. E muito bem, logo com «Star Power I: Overture» a abrir as hostes com um belíssimo instrumental, feito no espaço e com a matéria das estrelas, que, devagarinho, nos vai fazer subir até à estratosfera. Mas cabe à frenética «Star Power II: Star Power Nite», com o seu forte pulso kraut levar-nos para fora do campo gravitacional da Terra. No final desta suite, o foguetão fica à deriva, tendo os seus tripulantes mais nada a fazer senão olhar para as estrelas, galáxias, cometas e buracos negros e perderem-se, apaixonados, na imensidão do espaço.
O acto II é, de certa forma, o acto de transição entre o amor e a loucura, entre a paz e o apocalipse. Esta parte é composta por sete músicas pesadamente leves; isto porque, escondida por baixo das saias de uma aparente alegria, está uma amargura, que vai crescendo, até irromper em «Cannibal Holocaust», uma música carregada de descrença no ser humano e em que é repetida de forma exaustiva a frase «don’t tell me lies». A receita usada pelos cosmonautas para exorcizar este demónio é encontrada em «Hot Summer», última música do Paranoid Side, e posta em prática nas músicas do acto seguinte.
Em Scream: Journey Through Hell é revelada, então, a receita: levar o demo ao lugar de onde ele veio. «Cold Winter/Freedom» é o início da viagem atribulada (uma vozinha avisa-nos antes: «Hold on to your butts and get ‘em ready») dos exploradores do espaço pelo seu Inferno pessoal. Lá encontram várias naves espaciais cheias de cães mortos, que ouvem Led Zeppelin e Black Sabbath, entre muitas outras coisas. O caos continua a reinar viagem fora. Em «Can’t Contextualize My Mind» ecoa a voz de alguém que loucamente grita «Can’t control me! Don’t control me!» E a viagem segue a um ritmo frenético, até que, com o fim de «Talk», os cosmonautas regressam à Terra e apresentam as conclusões da sua intensa viagem a todos nós: é o início do curto acto IV. »Everyone Needs Love» é a simples constatação que dá propósito à vida e para a qual os Foxygen fazem aquela que é talvez a melhor música deste álbum: um riff bastante catchy, uma instrumentação muito bem doseada, os acordes certos, uma pequena viagem interior e um solo de guitarra bastante bom fazem desta uma belíssima canção.
…And Star Power é um álbum no qual pode não ser fácil «entrar». No entanto, para os felizes contemplados que conseguirem seguir a viagem cósmica de uma ponta à outra, só tenho a dizer: vai ser muito bom repeti-la e descobrir, de todas as vezes, uma coisinha nova, um pormenor escondido, no meio do caos e da calma, ao longo das 24 músicas que compõem o álbum. É uma experiência nova de cada vez que se ouve …And Star Power e é isso que faz dele um álbum tão bom. Curiosamente, é com este álbum que o duo dá razão à afirmação presente no título do seu registo anterior.