As águas do dia 12 de Abril podem não ter chegado a mil, mas tal facto não conseguiu impedir o escorrer de suor dos transeuntes que acolheram acaloradamente o hipnotizante reggae que sustenta traços do r&b,
jazz, soul e dub. O Coliseu, esse tão aclamado lar de loucos e sonhadores, abrigou uma sala cheia de um público maioritariamente jovem que demonstrou a familiaridade nutrida pelos Fat Freddy’s Drop, tendo até abdicado dos assentos em prol do inegável convite à dança que provinha do palco. Nem uma balada se
fez ouvir, apesar do espólio dos neozelandeses contar com temas melosos e não convidativos a movimento corpóreo. Com a premissa de «Bays» às costas, o quarto álbum lançado no final do ano passado, o grupo neozelandês optou por Lisboa para finalizar a longa digressão europeia. Em estúdio, já provaram o quão
versáteis podem ser, mas é de atuações que este mágico grupo é feito. Principalmente das oportunidades que têm de se apresentarem unicamente em nome próprio.
Se houve um começo, esse abrigou-se nas portas da memória, sendo que na totalidade do espetáculo fomos induzidos num sonho em que as nossas fantasias de tempos áureos de infância deram a mão à eterna juventude, induzidas por um baixo aliado à voz doce de Dallas Tamaira. Dallas, que no
início foi o mestre de cerimónias (apesar de já haver um no grupo), questionou os presentes se estes estariam preparados para o que se avizinhava e arrancou com «Slings and Arrows», tema fresco e fiel às raízes do que plantaram desde«Based On a True Story», o primeiro álbum. A reconhecível «Blackbird» arrecadou o desvario praticamente geral e teve o seu ápice quando o (super) trio dos instrumentos de sopro teve direito à sua ênfase conduzida pelo som da corneta, saxofone e trombone. Não descurando dos blues, presenciámos um palco iluminado a vermelho e deu-se o início à introspecção causada pela energia smooth de «Clean The House», talvez a malha que melhor resultou ao vivo. Após um vasto agradecimento de Dallas, o vocalista, o povo corroborou com um frenético bater de pés. Após um pedido de isqueiros no ar, os Fat introduziram «Tem Feet Tall»,single do novo álbum. Foi a vez de Hopepa aka Joe Lindsay suplantar as expectativas com a sua energia e extravagância enquanto dedicava 200% ao trombone. Porém, é com «Low Roady» que o povo une a voz num coro, que faz jus à componente lírica e canta pelo amor à música.
Findadas as apresentações – ao trio do sopro, ao DJ, teclista, guitarrista e vocalista e MC, Joe Lindsay enfatiza a estrela e o motor de gás que assumiu ser desde o início da festa: teatralidade, animação, irreverência são as características principais desta diligência de carne e osso, que se apresenta de ceroulas e blusa de pijama, com mangas pink glitter como acessório. Para a vibe atmosférica, é introduzido o recente «Fish In The Sea”, cuja batida é semelhante a uma viagem de comboio calma e com o toque atmosférico mais efectivo que os Fat Freddy’s Drop poderiam apresentar. Um enorme intervalo funky e new wave antecipa a brilhante «Shiverman», que inicia com um brilharete da diva que Joe Lindsay bem sabe interpretar, com o uso de uma harmónica que introduziu o ponto alto da noite. Segue-se «This Room» e «Wandering Eye», versão de um tema de Bob Marley que finda um alarve concerto que soube a pouco,
porque nunca poderia saber a mais.
Fat Freddy’s Drop consagram a intensidade de uma alma jovem transversal a qualquer idade, através da conjugação essencial de sete senhores do entretenimento cuja simples missão é invisível aos olhos: retratar
melodicamente a inocente doçura característica daqueles momentos que nos aumentam o rubor das faces e o pulsar do peito. Enquanto há amor para mais, só nos resta aguardar que retornem igualmente para outro concerto assim intimista, “For the love of music”.
Reportagem de Catarina Soares