fotografia gentilmente cedida por Duarte Coimbra
Foi há uma semana, mas ainda ressoa nos ouvidos (e nos sentidos) – nem o sal das gotinhas de chuva que caíram na Rua das Gaivotas6 não quiseram sair da pele. Tudo porque Filipe Sambado tinha uma boa nova: as canções de Vida Salgada (2016), o seu disco de estreia, estavam prontas a sair da sua cassete azul para ganharem vida em palco com a ajuda dos imponentes Acompanhantes de Luxo (Alexandre Rendeiro, Adriano Fernandes, Manel Lourenço, Luís Barros). E agora confirma-se: Sambado está a criar um monstro salgado feito de algodão doce – e ao vivo fica mais distorcido e mais progressivo – quem diria que o ska convive tão bem com o glam?
Mas o monstro precisa de amigo, e esta primeira recepção a Vida Salgada foi vivida em família: algodão doce e manicure à entrada, caras familiares no recinto e uma plateia que não conteve a cantorias das letras já decoradas, os aplausos, piropo e private jokes. Tal como se estivéssemos no quarto de Filipe Sambado, sentados e de unhas pintadas, a observá-lo a trocar de roupa, escutando as suas “canções de libertação”, tal como confidenciara ao Altamont. Saltitando de indumentária em indumentária – de saia para calças, do colete à camisa tigresa psicadélica -, Sambado condimentou o concerto à vista, ao ouvido e ao convívio.
Sambado percorreu Vida Salgada na íntegra, acrescentando “Tabaco”, “Tanga” e “Joelhos” do EP Ups…Fiz Isto Outra Vez (2014). O artista português só retirou o pé do acelerador no encore, “Nó no Peito”. Já sem banda, Sambado chama ao palco Calcutá (Teresa Castro), membro dos Mighty Sands que também dá voz à sexta faixa do disco. Juntos, em uníssono com o público, cantavam repetidamente “E se eu nadasse até não conseguir voltar, ias passar a tua vida toda a ver o mar”.
A Primavera chegou e Vida Salgada recebeu o equinócio. As canções desfloraram a estação, onde tudo ganha cor e o frio torna-se quente, e Filipe Sambado foi para além do mero concerto: ele abriu as portas do seu quarto, da sua intimidade. Aliás, da sua liberdade, tal é o Grito do Ipiranga.