Mago, sacerdote de bons e belos feitiços, Mark Oliver Everett e os Eels estão de volta. A bruxaria prometia ser extrema, mas algum do encantamento esperado ter-se-á dissipado um pouco, ficando aquém de sortilégios anteriores.
Todos gostamos de Mark Oliver Everett e da banda que vem levando às costas desde 1996, os Eels. Antes, e em nome próprio, já andava por estúdios e palcos, mas é com Beautiful Freak que tudo verdadeiramente começa. E começa muito bem, diga-se. Neste quarto de século, mais ano menos ano, o bom barbudo tem-nos dado álbuns de grande qualidade, aqui e ali menos interessantes e menos intensos, mas na verdade esperamos sempre por eles com alguma inquietação e expectativa. A colheita, se quisermos ser justos, tem sido ótima e muitas vezes voltamos a fazer rodar o primeiro disco, assim como outros belos momentos como Electro-Shock Blues (1998), Daisies of the Galaxy (2000), Blinking Lights and Other Revelations (2005) ou Shootnanny! (2009). São discos que estão na base da admiração que muitos sentem pelo homem que tão bem nos canta sobre a morte, o sofrimento, a dor das pequenas e grandes separações, as angústias do dia a dia e as depressões que acontecem ao virar das páginas da vida. Para mais, Mark Oliver Everett nunca nos deixa ficar mal, tal a sua incapacidade para fazer maus álbuns. No entanto, o disco que mais recentemente gravou – Extreme Witchcraft – dificilmente ocupará o podium mais restrito da sua já longa discografia. A bruxaria não encantou como deveria e como desejávamos. Mas há, mesmo assim, boas canções e bons momentos que provam que a inspiração de E está de volta, e isso é sempre motivo de satisfação.
A reclusão a que nos vimos votados nestes últimos dois anos levou muita gente a compor como se não houvesse amanhã. No caso particular de Mark Everett, todos sabemos que as piores circunstâncias da sua vida sempre foram a chama (mesmo que sofrida, como é evidente) que incendiou os seus melhores trabalhos, mas Extreme Witchcraft escapou a essa regra. O confinamento e um recente divórcio poderiam fazer suspeitar que nova obra-prima viria a caminho. Não sendo essa a realidade, também é certo que o disco se aguenta bem a meio da tabela do que já produziu. Há bonitas e bem esgalhadas canções como “Amateur Hour” (bom rock rasgadinho a abrir o álbum, sim senhor!), “Good Night On Earth”, que continua na senda da faixa de abertura, assim como “Strawberries & Popcorn” e “Grandfather Clock Strikes Twelve” são de boa qualidade, a última fazendo lembrar, por estranho que pareça, o estilo irrequieto de Prince. O pequeno príncipe de Minneapolis gostaria de a ter feito e cantado, seguramente. E assim, quase meio disco vai cumprido, mas a segunda e maior fatia de canções constantes em Extreme Witchcraft não nos parece da cepa da primeira, perdendo-se o disco numa névoa de alguma mediania criativa. Há “The Magic”, verdade, embora pouco inventiva. Embora continuemos a gostar bastante daquele som meio sujo e meio seco que caracteriza o universo sonoro de Mark Everett, talvez só a quase derradeira “Learning While I Loose” nos convença por inteiro. E assim sendo, feitas as contas, o saldo não deixa de ser positivo, mas um pouco distante dos belos álbuns que enumerámos no primeiro parágrafo deste texto. Talvez alguma insistência nos faça aproximar um pouco mais do disco saído há pouco.
Fazendo um resumo do que vai dito, Extreme Witchcraft tem algum sabor a desilusão, a primeira que sentimos neste ano de 2022 cujo primeiro trimestre ainda não se cumpriu. Um novo disco dos Eels é sempre razão para contentamento, como antes já referimos, por isso apostamos todas as fichas no próximo. Que venha, para decididadmente virarmos a página deste sortilégio que não resultou da forma extrema como o seu título prometia.