Blood Orange compõe Freetown Sound de roda de um R&B elegante e intrincado, tão necessitado de ritmo como de silêncio, de frenesim vocal como de languidez coral. A própria narrativa do álbum ganha desenvoltura pelo recorrente confronto entre aquela materialidade groovy que Cupid Deluxe já apropriava e uma outra solenidade necessária, coisa mais delicada e gravosa. É precisamente essa dicotomia que torna fundamento da intenção crítica perante os estudos de género e as problemáticas raciais de Dev Hynes, julgadas na sua pele, metafórica e literalmente. Enquanto não-caucasiano e não-heterossexual, o músico é arquitecto de um álbum compreensivo, inclusivo, integrador, “para os que não são pretos quanto baste nem gays quanto baste”, em sua citação, baseado no ameno rebelar perante a convenção, com legitimação vinda do carácter do próprio autor e não de artifícios ideológicos àquele alheios.
“Best to You” é isto. Tem que a postura perante o ódio seja de celebração, tem que Empress Of traga os seus preceitos latinos e os “th” deliciosamente defeituosos, tem que o momentum tribalista seja esqueleto da atmosfera requintada. Hynes está a cargo dos murmúrios ascéticos a meio termo, enquanto Empress corre atrás de tempo meio aflita, uma qualquer ansiedade vocal justificada pela sujeição à letra, sobre relações unidireccionais e consequentes despersonalizações daqueles de que partem os esforços, especulo eu. De qualquer maneira, fora a especulação, “Best to You” é uma faixa directa, acessível, embora de tecido delicado, que desbloqueia a sonoridade de Freetown. Menos comedida, menos a receio, meio a tactear, algures volta e meia vertendo Grace Jones, mantém-se meiga, de ternura sorridente, ainda que em invólucro festivo.