No segundo dia do NOS Alive de 2023, a Palma de ouro foi para o nosso good old Jorge. No entanto, os Arctic Monkeys não desmereceram, dando um concerto bem competente.
Depois da maratona de concertos do dia de abertura do NOS Alive de 2023, outra jornada idêntica vinha a caminho. Quase nem há pausa para o devido descanso, por isso nem vale a pena qualquer tipo de queixa. Havia que seguir em frente, buscar o som e o acorde perfeitos nos concertos que se avizinhavam. Recarregar baterias é um luxo a que quase não temos direito. No entanto, e para sermos justos, também não é algo em que pensemos de forma insistente. Se por um lado é verdade que o corpo pede cadeira e sombra, por outro também parece esquecer-se desses sossegos, desejando dança e o falso sol das luzes dos palcos. O que precisamos é de alegria e comunhão com a música. Uma cerveja fresca nas mãos e uma vontade pronta para ouvirmos o que vai acontecendo à nossa volta.
Como sempre, escolhemos os nossos targets e nem sempre conseguimos cumprir as promessas feitas. Para o dia de ontem, não eram assim tantos os concertos previamente referenciados. Cabiam em pouco mais de uma mão.

Ontem não começámos com um artista português. Quebrámos essa quase regra, mas também é para isso que existem. Por falar em quebrar, foi com os Idles que tudo começou. Palco NOS Alive, quase às sete e meia da tarde. A fúria e o brutalismo da banda de Bristol começaram a fazer vítimas. Era vê-los aos saltos, abanando-se como se estivessem possuídas. O moderno punk-rock dos Idles também é capaz de disparar noutras direções, pelo que alguns temas mais tranquilos do recente Crawler foram igualmente bem recebidos. Mas tratando-se dos Idles, o que mais apetece é uma boa tareia marota, loucura qb e energia natural e renovável a cada concerto dos britânicos. Com eles, não há subtilezas. Infelizmente, nem no som, que resolveu fazer cara feia em alguns locais da extensa plateia. Lá tivemos nós de procurar novo poiso, onde a pancada soasse melhor e menos dolorosa. Mas chega de conversa: rock também é isto. Acabaram com uma canção punk anti-fascista, dizendo assim: “We’ve been Idles, l’ve been shit, you’ve been magic”, dirigindo-se ao público.

Fomos num instante perceber o histerismo à volta de Girl in Red. Acho que entendemos a coisa. Uma rapariga canta os seus dramas (como tantas e tantos), fala sobre os amores sentidos e desejados, mas tudo num invólucro adolescent music. Muita grita e corre, muito pula e canta Marie Ulven. Tudo certo, portanto, quando é isso que o público quer. O Palco Heineken estava repleto de gente, era quase impossível entrar. Parecia um convite a que nos fôssemos embora. Fomos.

Projetavam-se no palco os propósitos do concerto de Lizzo: dançar, cantar, gritar, ser livre e ser feliz com toda a liberdade a que temos direito. Tudo certo, portanto. Vestida a rigor, e acompanhada de banda e coros, a cantora norte-americana fez do seu concerto uma divertida pregação. Como se fosse uma espécie de Messias dos tempos modernos, pregou o amor, o amor total e sem barreiras através da sua potente voz. Nunca deixou de lado por muito tempo a sua flauta transversal (instrumento algo inusitado numa artista deste estilo) e mudou várias vezes de vestidos. Cantou quase uma dezena de canções, entre as quais a conhecida “About Damn Time”, com a qual encerrou a sua presença no NOS Alive 2023. Mas, entre tantas, como já referimos, houve tempo para “Special”, “2 Be Loved (Am I Ready” e até para uma cover de “Yellow”, dos Coldplay. Sempre divertida e bem disposta, o concerto de Lizzo teve uma luz particular, é um facto. Terá deixado muitas pessoas extremamente satisfeitas, sobretudo aquela a quem cantou os parabéns. Foi mesmo uma grande festa.

“A lua estava lá fora / para além do firmamento”. Foi assim que o nosso Jorge Palma começou. Depois, “deu-nos lume” para vários dias. Concerto bem elétrico, e que bom foi ver Jorge Palma em grande forma. Ora à guitarra (acústica ou elétrica), ora ao piano, foi um rodopio de êxitos, dos tais que já fazem parte do imaginário musical português. Tê-lo à nossa frente e em grande estilo é um privilégio que talvez nem todos se apercebam. Atrás de nós, alguém dizia incansavelmente: “És o maior, caralho, mete isso na cabeça!” Algumas canções do novo disco apareceram no alinhamento, naturalmente. “Uma Estação no Inferno” é um pequeno exemplo do bom material que se encontra em Vida. “A espuma dos dias ao som do jazz”! é um bonito verso de uma bonita canção, e foi um ótimo momento! E depois, alguns clássicos, apenas ao piano. “Estrela do Mar” (com aquele interlúdio de puro génio, de puro classicismo melódico, a roçar a perfeição. Resultado: “Só sei que por instantes deixei de pensar”. Tivemos direito a tudo, até a “lamber uma lágrima”. De “Deixa-me Rir” a “Frágil”, tudo passou pelo Palco Heineken. E o nosso grande homem, nem água bebeu. “Ai Portugal, Portugal”, que assistiu (no recinto e pela televisão) ao mais saboroso concerto da noite. Que nos perdoem os macacos dos arredores de Sheffield.

Isto de querer ser muito adulto quando se é jovem pode ser uma doença tramada. Quando ataca, dá sintomas de pose onde costumava haver substância. Esse vírus atacou recentemente os Arctic Monkeys, mas parece que se encontram a caminho da cura. Pelo menos em palco, parece mesmo que os tempos menos interessantes já lá vão. Valha-nos isso. Chega de pose de hotel fino, e embora voltar ao campismo selvagem! É o que se deseja, mesmo que continuem a envergar blazers de boas marcas. Os cabeças de cartaz do segundo dia do NOS Alive foram buscar muitos temas dos seus álbuns mais antigos, e com eles foram construindo a tour The Car. Foi bom ouvir temas de Favourite Worst Nightmare (como “Fluorescent Adolescent” ou “Brainstorm”), mas também “Cornerstone”, “Crying Lightning” e “Pretty Visitors”, de Humbug. Mas foram ainda mais atrás, até ao inicial Whatever People Say I Am, That’s What I’m Not (“The View From The Afternoon”). E de AM, por exemplo, foram também várias as que tocaram, das quais nos lembramos de “Arabella”, “Knee Socks” e “Snap Out of It” e “Do I Wanna Know?”. Como se percebe, por este caldeirão de escolhas, foi um concerto que terá agradado a muitos. Equilibrado, mas algo frio e com muito pouca comunicação com a imensa plateia de milhares e milhares de fãs da banda. A banda inglesa, no entanto, deu um concerto bem competente, o que é sempre coisa de valor. Sim, estão mais adultos e maduros musicalmente, se comparados com os anos longínquos do início da sua carreira, mas também não é preciso abusarem no crescimento.
E pronto, a noite findou mais ou menos assim. Sorrisos de satisfação, nenhum vento ou frio (que incrível novidade!) e com muita gente já a perspetivar o dia seguinte, o derradeiro da edição de 2023. Mas nestas coisas do tempo, o que importa é não dar passos que os minutos não permitam. Há tempo para tudo, como hoje se verá. Assim sendo, até já.
* (uma última nota para atribuição do prémio t-shirt do dia, a de uma rapariga que dizia, em letras bem legíveis: “I’m not Alex Turner but please kiss me just the same”)
Fotografias: Inês Silva (excepto Lizzo e Arctic Monkeys)






































































