Em 1997, os Violent Femmes visitaram Portugal pela primeira vez. Eu estava nessa noite no pavilhão da Académica, em Coimbra, preparado para celebrar a primeira ocasião em que poderia ver ao vivo, finalmente, uma banda que muito me havia marcado. Com uma primeira parte a cargo de uns muito jovens Da Weasel – e com um Pacman magríssimo e de cabelo à máquina zero – essa noite foi um triunfo. A verdade é que, já então, os Violent Femmes viviam necessariamente de um circuito de nostalgia antes do o nome ter sido inventado. Os rapazes de Milwaukee andam nisto desde as suas origens, em 1981, quando ainda nem Gordan Gano era membro oficial da banda. Não fosse o extraordinário disco de estreia, homónimo, de 1983, e os Violent Femmes provavelmente seriam mais um entre milhares de projectos interessantes que se desintegrariam pela natural lei da vida. Mas esse monumento, casa de clássicos como “Kiss Off”, “Gone Daddy Gone” ou o omnipresente “Blister in the Sun”, marcou de tal forma a emergência de um novo som que ecoa até hoje.
Não é, obviamente, o único disco relevante da banda. Hallowed Ground, de 1984, é outro fortíssimo testemunho, bem como 3, de 1989. Em termos comerciais, o namoro dos melómanos com os Violent Femmes terminou em 1991, com Why Do Birds Sing. Houve outras coisas interessantes, como por exemplo New Times, de 1994, mas sejamos francos, já ninguém queria saber.
Este We Can Do Anything, fresquinho, acaba por ser uma surpresa. Não apenas por ser o primeiro disco dos Violent Femmes em 16 anos, mas também porque a banda continuou, até bem recentemente, envolvida em disputas internas, saída de membros e outros problemas do género.
A primeira nota que nos assalta ao ouvir este novo disco é que nada mudou. O som continua igual, aquele punk-folk acelerado que é marca registada da banda, até a voz de Gano está igual e em boa forma. “Memory”, o tema de abertura, é por isso um bom cartão de visita de todo o disco. Não deslumbra, mas é agradável, e até traz uma discreta guitarra eléctrica lá por trás. Há alguma tentativa de dar algumas novas tonalidades à paleta habitual, mas sempre de forma muito contida. Estes não são uns Violent Femmes à procura dos tempos, em busca de novos fãs. Estes são os Violent Femmes de sempre, movidos pelas ainda óptimas letras de Gordon Gano.
Esse é que é o principal trunfo mas também a grande fraqueza deste disco. Um som adolescente de uma banda que há muito deixou de o ser, e sem malhas demolidoras que nos possam restaurar a fé de que do campo dos Violent Femmes ainda possa vir uma ou duas canções novas que nos venham a salvar a vida. Já não estamos nesse campeonato, infelizmente.
Em 1999, voltei a ver os Femmes ao vivo, desta feita na praça Sony. Ao contrário do que havia sucedido dois anos antes, apanhámos um Gano completamente alcoolizado, falhando a letra e dando metade do concerto sentado. Um artista em piloto automático que já não queria saber. Agora não temos esse excesso, antes uma tranquilidade que, apesar de tudo, beneficiaria de alguma dose de loucura que está ausente de We Can Do Anything. O próprio título do disco, infelizmente, desmente-se ao ouvi-lo. Um álbum competente, que pode servir de mote a novos concertos e que não desagradará aos fãs da velha guarda. Mas que não deixará marca e que empalidece necessariamente face aos discos dos anos 80.