É com alguns meses de atraso que vos damos a conhecer After the Fall. Erro nosso, pois claro, mas devidamente compensado a partir de agora, neste tempo que precisava de um álbum assim. Senhoras e senhores, ouçamos os Videodrones!
Apesar de não serem propriamente novatos no mundo da música, parece seguro que se perguntarmos a várias pessoas pelos Videodrones, é bem provável que o máximo que conseguiremos obter como resposta é a confusão do nome da banda com o título do icónico filme de David Cronenberg, do início dos anos oitenta. Na verdade, e eventuais enganos à parte, Videodrones é o nome de um grupo de música de origem dinamarquesa. São apenas dois, os seus integrantes, a saber: Kristoffer Ovesen e Jakob Skøtt. Estes, por sua vez, desdobram-se em alguns outros projetos, uma vez que a vida é difícil, como sabemos, sobretudo para quem faz da música um lugar distante das rádios, das televisões, do mainstream, digamos assim. Mas o que fazem é tão bom, que nos sentimos obrigados a partilhar aquele que é o mais recente trabalho do duo. Chama-se After the Fall e nasceu para o mundo em maio do ano passado. Como se percebe, chegou até aos nossos ouvidos com alguns meses de atraso, mas a vida é mesmo assim e nada há a fazer. A não ser, claro, alguma justiça, que é a intenção óbvia destas linhas, uma vez que After the Fall é mesmo um belíssimo disco. Se apreciam música instrumental capaz de nos obrigar a fazer as malas e partir para incertas e distantes paisagens sonoras, então não percam tempo: give it a go! Ou, como se diz na língua de origem destes magos da electrónica, giv det en chance!
Se tivermos em conta os álbuns anteriores do duo, After the Fall traz algumas novidades, sobretudo no que diz respeito ao recurso à bateria, algo bem presente neste trabalho, o que vem dar ao álbum um outro tipo de dinamismo. Mais sólido e menos etéreo, se comparado com o que no passado Kristoffer Ovesen e Jakob Skøtt gravaram, After the Fall tem excelentes temas. Percebe-se que a identidade da banda não se perdeu, antes pelo contrário. Tornou-se mais larga, mais ampla, passando a caber nela, a par do que já lhe era idiossincrático, um outro discurso rítmico e melódico. É ainda verdade que as paisagens sonoras persistem, como anteriormente se verificava. Elas são, aliás, a essência do que os Videodrones fazem, sendo que neste álbum se expandem para outras esferas de encantamento. Para além da novidade da bateria, também se garantiu lugar ao uso das guitarras, e a junção desses instrumentos com os sintetizadores, que eram a sua imagem de marca exclusiva, enriquece esta nova etapa da banda de uma maneira notória e feliz. Tudo ganha outra dimensão, e o caminho sonoro proposto nos quase trinta e seis minutos e meio de After the Fall é de enorme riqueza. Por aqui passam sons e ecos de algum psicadelismo bem comportado, mas também há lugar para certas dimensões oníricas que o kraut dos anos setenta tão bem soube trazer para a música. Para quem gosta de kosmische musik, este álbum é um autêntico regalo, um bálsamo para as cabeças que querem divertir-se, viajando enquanto ouvem música.
Em temas como “Void Facer”, “Scorpio” “After the Fall”, “Wasteland Interceptors”, “Ar Amarelo” (exatamente escrito assim, em bom português) ou “Blaster” sabe mesmo bem ouvir estes post-rockers de gema! Como sabe igualmente bem, ouvindo-os, ouvirmos também, e ao mesmo tempo, algumas das melhores bandas alemãs do kraut, como Harmonia, Cluster e Neu!, por exemplo, que parecem convocadas para cada tema de After the Fall. Uma espécie de convidados especialíssimos e omnipresentes. Esse atributo divino humaniza-se neste álbum, está ao nosso lado e ao nosso alcance (basta fechar os olhos e descontrair), fazendo dele a mais grata (e atrasada) surpresa de 2022 que só descobrimos em 2023. Mas o que importa esse intervalo, essa elipse temporal? Nada, ou quase nada, como é óbvio. Afinal, o que é o tempo a não ser uma poderosa e imediata abstração dos instantes que o compõem?