Bring me the slow dancing horses and the space stars cowboys! Este poderia muito bem ser o título desta longa metragem sonora. Mas os músicos resolveram ser menos poéticos e mais concisos. Optaram por Suss, deixando a poesia brilhar na quase hora e meia que o álbum propõe.
O enredo para esta belíssima teia sonora seria mais ou menos simples, variando um pouco consoante o ouvinte, claro está. Mas talvez não fugisse muito a isto: perdidos em melódicas galáxias, homens montados em cavalos de som viajariam até às nossas cabeças para nos segredarem coisas bonitas aos ouvidos. Quando tudo estivesse a chegar ao fim, o mundo estaria mais tranquilo, cintilante e prazeroso. Depois, partindo para outros lugares, os cowboys do espaço e das estrelas ficariam, mesmo assim, connosco, clonados para sempre no nosso espírito e na nossa alma. The end.
Após este momento em que demos asas à imaginação, sejamos um pouco mais concretos perante o mais radioso objeto sonoro que nos veio parar às mãos neste ainda início de 2023. Trata-se de Suss (o nome servindo para título e banda), álbum saído em dezembro do ano passado e que viajou até nós sem pressas, pairando no ar, irresistível, elegante e sedutor. Talvez por isso, se tenha um pouco. Para mais, é duplo e apresenta-se em vinte e um esplendorosos momentos. Não é um disco para ser ouvido em correrias e atropelos. Exige tempo, calma, vagar. Assim sendo, é um trabalho que contraria a vertigem dos nossos dias, e também por isso é precioso, um diamante de muitos e bons quilates.
Os Suss, segundo os próprios nos informam na sua página oficial, são uma banda de country ambiental. Nunca tal designação havíamos visto, mas não nos parece mal arranjada a ideia. Redutora, mesmo assim. É que o trio que a forma (Jonathan Gregg, Bob Holmes e Pat Irwin) são, na verdade, uns simpáticos e meio-idosos cowboys da terra do tio Sam, pelo que talvez venha daí o apreço pelo country, que nem sempre se nota, diga-se, ao longo de Suss, o álbum. Mas mesmo que o notemos, ele apresenta-se de tal maneira estilizado que se transforma numa outra coisa. Um bom Morricone em câmara lenta, talvez, sofisticado e onírico, insinuando-se sobre nós, afagando-nos a pele da alma, desejando a nossa proximidade. Com Suss, sentimo-nos numa espécie de solidão acompanhada.
Há pouco fizemos referência ao facto de Suss ser um álbum duplo, tanto no formato vinil como em cd. Para além dos temas novos, o disco apresenta quatro eps, todos eles em simbiose perfeita com o tom geral de Suss: Night Suite, Heat Haze, Winter Was Hard e Across The Horizon.
Ouvir Suss é um consolo. A possibilidade da música nos oferecer coisas belas é inesgotável! A banda perdeu um dos seus membros (Gary Leib) em 2021, mas soube continuar a trilhar o seu caminho como um trio, rodeando-se dos seus instrumentos de sempre (guitarras elétricas, pedal steels, dobros, acústicas, bandolins, sintetizadores, harmónios…) e fazendo música de uma beleza estratosférica. Se já o faziam antes, em Suss terão, provavelmente, exagerado. É quase impossível destacar alguma das faixas do álbum, uma vez que todas nos garantem momentos de tranquilidade e prazer. No entanto, se quiser picar uma ou outra, comece pelas que agora referimos, e verá que dificilmente ficará apenas por essas escutas. Mesmo assim, arriscamos na escolha: tente “Flagstaff, AZ”, “Ash Fork, AZ”, “Across The Horizon” (a lembrar o maravilhoso Ry Cooder de Paris Texas) ou “Everything Is So Beautiful”. Irresistíveis, todas elas, assim como as restantes.
Tivéssemos nós ouvido este disco no mês em que saiu, e provavelmente teria lugar cativo na lista dos melhores de 2022. Pelo menos nas escolhas deste vosso escriba. No entanto, sabe igualmente bem pensar que as boas descobertas não se fixam em meses ou anos, sejam eles quais forem. As boas descobertas são para a vida. E estes cowboys das estrelas merecem brilhar por tempos infindos!