As Pega Monstro não eram apenas das bandas mais promissoras em solo luso: eram já das mais interessantes nestas paragens. Depois de um EP e um longa duração homónimo de canções especialmente interessantes, chegou-nos agora Alfarroba. Este disco é e não é a confirmação da banda no panorama musical português: é-o porque é efectivamente dado um passo em frente, sobretudo ao nível da produção, mas não o é porque o essencial – um rock difícil de igualar, de identidade própria, conciliando desafio punk e melodia apurada – já lá estava; o que tínhamos antes, portanto, não eram indícios promissores, mas uma obra que já valia muito em si mesma (oiça-se por exemplo do anterior disco a inaugural “Carocho” e a brilhante “Homem das obras” – como ficar indiferente a isto?).
Com mais experiência de palco e já algumas atenções voltadas para a banda, haveria sempre o risco das Pega Monstro não se reinventarem, ou não saberem responder às expectativas nelas depositadas (por alguns). Mas o que fizeram Júlia e Maria Reis, as irmãs que formam este duo, é um passo natural que não só não defrauda como excede essas expectativas. Raramente, para não dizer nunca, se ouviu por cá um disco destes: urgência rock, simultaneamente íntima e explosiva, que desafia os cânones, feita com uma qualidade e identidade que se demarcam de tudo o resto que por aí anda (e, que me lembre, do que por aí andou): fazem a maior parte dos outros projectos soar a brincadeira, a cópia ou a experimentalismo infrutífero (salvam-se algumas excepções). Desengane-se quem vir neste elogio a colocação da pressão ou responsabilidade. Um pedido ou uma exigência. Não é nada disso: é antes um agradecimento por esta doce tareia musical.
Alfarroba é mais uma prova que a boa composição pode perfeitamente andar de mãos dadas com a ambição, sem que com isso se perca nada de relevante na atitude e espírito rock marginal, absolutamente contracorrente, de que as Pega Monstro (que aqui a sabem clarear) não abdicam, e de que a Cafetra, a editora que formaram, tem também sabido preservar. Aqui e ali politicamente incorrectas, sem ceder um milímetro ao facilitismo, nem nas músicas de rock mais abrasivo nem nas mais intimistas (oiça-se a terna “És tudo o que eu queria”, com palavras como “merda” e frases como “Só com droga na cachola é que ficas mais contente” – uma espécie de Best Coast sem pudor ou embelezamento). O disco contém também as excelentes “Braço de Ferro” e “Não Consegues”, o single “Branca” – já com vídeo -, e os portentosos solos de guitarra em “Estrada”. As Pega Monstro estão a crescer, e, ao contrário do que acontece com muitos, isso não tem nada de entediante – bem pelo contrário.