Luz é uma chama imensa, o álbum glorioso de Djavan, com o qual começou a ganhar a eternidade. É tão perfeito que não parece real. Mas é. Veio ao mundo em 1982 e soa de forma perfeita até aos dias de hoje.
É difícil perceber com se pode passar de Seduzir (1981) para Luz em apenas alguns meses. Parece mesmo coisa impossível, e por isso merecedora de uma qualquer explicação que a razão não conseguirá acompanhar sem a interrogação do espanto. Mas não nos entendam de forma errónea. Seduzir é um ótimo disco, já aqui louvado há tempos e de maneira a não deixar dúvidas sobre as suas amplas qualidades. Mas a distância de tom, de imaginário (tanto melódico como rítmico) e de ambição entre ambos é, de facto, colossal. Seduzir aponta para dentro, para o Brasil interior, para a essência que Djavan vinha trilhando, enquanto Luz se espraia até ao infinito, piscando descaradamente o olho à internacionalização. Por vezes, como bem sabemos, a ideia do salto maior que a perna apanha os músicos em falso, sendo fatídica a ambição que os levou ao risco. No entanto, também pode compensar, o que foi o caso. E de que maneira! Depois de Luz, Djavan passou a pertencer ao brilho do Olimpo da música popular brasileira, sabendo merecer cada centelha emanada desse extraordinário álbum do início dos anos oitenta. E ainda hoje o esplendor de Luz é capaz de provocar o melhor dos incêndios em quem o ouve.
Vamos, então, às canções. Não vale a pena destacar uma ou outra, porque verdadeiramente não haverá uma que seja que deva ficar de fora do lote das melhores. É claro que algumas houve que se destacaram, mas as restantes são tão boas que não poderemos incorrer em injustiças. Vejamos: “Pétala”, “Luz”, “Nobreza”, “Capim” e “Sina” (o Lado A do disco) são clássicos do cantor e compositor de Maceió, presentes em todos (ou quase, vá) os concertos do alagoano até hoje. É evidente que algumas se tornaram ainda mais conhecidas do que as restantes, assim gostemos mais do romantismo de “Pétala” (“Por ser exato / O amor não cabe em si”) ou do swing de “Capim” (“Que fim levou o amor / Plantei um pé de fulô deu capim”), isto para não falar da arrebatadora e mítica “Sina” (“Como querer Caetanear o que há de bom”), que inventou um novo e incontornável verbo no português do país irmão, caetanear.
Já no Lado B, pouco ou nada se nota, por comparação, em termos de grandeza dos temas que nele mora. A saber: “Samurai” (com participação especialíssima de Stevie Wonder!), mas também “Banho de Rio” (que parece colhida de Seduzir, de tão delicada), “Açaí” (um hit histórico, até em Portugal), “Esfinge” (que merece mais atenção do que a que lhe é dada) e “Minha Irmã”, samba à maneira estilosa de Djavan.
Luz nasceu virado para a Lua, mas brilha como o Sol em todos os seus quase quarenta e dois minutos de duração. Ronnie Foster, o produtor norte-americano da moda naqueles tempos, fez um excelente trabalho, valorizando ainda mais a riqueza intrínseca dos dez temas em apreço, todos compostos exclusivamente por Djavan. O músico e o seu trabalho foram muito bem recebidos pelos público e crítica do Brasil, Estados Unidos, Portugal, Espanha, França, entre outros países europeus. Agora, tantos anos depois dessa luminosa estreia, e quase por mero acaso (a descoberta do álbum por um amigo e companheiro altamontiano), resolvemos dar-lhe mais uma volta. Colocar a girar um disco como Luz foi, como sempre, um prazer enorme. Até porque “Uma grande amizade é assim”, e isso é imperativo não esquecer. Luz e nós somos íntimos há mais de quatro décadas.