Closer é o disco mais belo e trágico da história da pop, e quem disser o contrário tem o coração avariado.
Como a beleza e a tragédia de Closer são servidas em partes iguais, nunca ficas triste a ouvi-lo, só contente e suicida. Se porventura te atiras da janela do décimo-quarto andar (pode acontecer), é com um sorriso embevecido que o fazes.
Não precisas de biografia para te comoveres com a tragédia de Closer (toda a obra de arte que requeira circunstâncias não é uma obra de arte- é um exame de direito penal). É irrelevante se Ian Curtis se enforcou aos vinte e três anos em Manchester ou se está numa piscina em Miami aos sessenta. Closer é trágico em si mesmo: nas suas dolentes melodias, nas suas lúgubres palavras, nos seus ásperos sons. Tudo é pincelado a preto e cinzento (os mais belos pretos e cinzentos da história da arte), um film noir onde a femme fatale é a própria morte.
A bateria é fria e robótica, uma engrenagem onde não vais querer ficar entalado. O baixo desenha a melodia, dando espaço à guitarra para ir atirando brincalhões baldes de ácido à tua cara. A voz é ora raivosa, ora soturna, cada vez menos raiva, cada vez mais tristeza e desamparo. Os sintetizadores choram, molhando as teclas, estragando os seus circuitos. Os anos oitenta começaram oficialmente com a electrónica de Closer mas o álbum não tem culpa nenhuma do que os anos oitenta fizeram dele.
Closer é disco sound macabro, como um nazi a dançar, ou um pelotão de fuzilamento no engate. Closer é tão distópico que ao pé dele o Orwell é bonacheirão e supérfluo como o apresentador d’ “O Preço Certo”. Mas o militarismo futurista de Closer nada tem de boçal ideologia; é apenas uma metáfora do sofrimento humano. E ninguém compreendeu melhor o sofrimento humano do que o sorumbático Ian Curtis.
Closer chove sempre, mesmo que lá fora faça sol. Closer não é bem um disco, é mais um túmulo, mas tu preferes sepultar-te nele a viver lá fora sem a sua assombrosa beleza. Closer é a transcendência possível para os ateus e a descrença possível para os crentes. Closer é uma depressão que não vais querer curar, uma ninhada de gatos lindos afogados no alguidar. Closer matou a pop: depois dele toda a música parece fútil e engraçadinha: os Tindersticks, uma girls band ; os National, uma banda de kizomba.
Closer é intraduzível, nenhuma palavra o alcança, nenhuma teoria o explica. Mas ao ouvi-lo sabes que estás um pouco mais perto: da beleza pura, da crua verdade.