O sétimo disco de Jorge Palma, Quarto Minguante, é bem mais interessante do que se diz dele por aí.
Estamos em 1986, ano do Senhor. Palma procura a sua nova banda através de um anúncio no jornal Se7e; o baterista Joca de Sousa e o guitarrista Tó Zé Chaparreiro respondem à chamada. Desta feita, em vez de tratar sozinho da direcção musical, partilha todo o processo com os seus novos compinchas. Daí Quarto Minguante ser atípico, a carta fora do baralho. A editora franze o sobrolho, as relações azedam: será o último disco com o selo da EMI. E as más línguas começam a maldizer. Reza a história que Quarto Minguante é um antro feio, pouco recomendável para pessoas de bom gosto. Mas nem sempre a história reza bem…
É verdade que é menos inspirado do que os seus outros discos dos eighties. Por exemplo, não há por aqui nenhuma super-canção, daquelas que todos sabemos de cor. Mas quase todo o álbum é vibrante e trauteável. Nem só de canções V.I.P. vive um autor.
Outro atributo assusta a crítica: o namoro desavergonhado com a pop mainstream de então. O caso mais flagrante acontece logo no tema de abertura: “Diz-me Tu, Marilu” não destoaria num disco de Duran Duran. E daí? Nunca ninguém disse: “estou um pouco embaraçado, doutor, apanhei gonorreia e “pop mainstream”…
Quarto Minguante tem outra particularidade: a primeira vez em que outrem se imiscui na composição. Falamos de “O Gigante na Jaula de Vidro”, com música de Tó Zé Chaparreiro e letra de Palma. Se descontarmos o facto de a melodia ter sido descaradamente roubada a “Heroes”, de Bowie, é um belíssimo tema. Está mal Palma ter denunciado o plágio com o verso “eu sou o teu herói”. Chibo…
“Bom dia” não é só deliciosamente eufórica – Palma engolindo anfetaminas, um frasco inteiro pela goela abaixo -, como tem o inesquecível verso: ‘eu sou o vagabundo mais feliz que existe’, o título das Memórias que Palma nunca escreverá. A canção título é outro dos pontos altos, onde palavras e música desenham, soturnas, o monstrengo da depressão. A malha menos interessante é “Ordem é Ordem”, algo parva e inconsequente, gravada numa bebedeira, só pode. Os restantes temas são bastante decentes, não merecendo a maledicência que ciranda por aí.
Por tudo o que aqui escrevemos, um apelo: deixem de chamar patinho feio a Quarto Minguante! Se o disco não estivesse ensanduichado entre as obras-primas O Lado Errado da Noite e O Bairro do Amor, teria certamente mais créditos. Reabilite-se, de uma vez por todas, esta pobre criatura. Sejam amigos…