As músicas do enorme Serge Gainsbourg em versão sinfónica, pela voz da maior das suas musas, Jane Birkin. Oportunidade de ouro para revisitar a obra de um mestre que merecia, sempre, ser mais celebrado.
Jane Birkin, a musa entre as várias musas de Serge Gainsbourg, regressa novamente ao seu mestre, ao seu amante, ao seu amigo de uma vida.
Este é já o terceiro disco de Birkin celebrando a obra do seu célebre e já falecido ex-marido. Ela é, aliás, juntamente com Mick Harvey, a grande campeã e celebradora do monumento que é a obra musical do maior artista musical francês de sempre.
Depois de ter feito, por exemplo, Arabesque (2002), versões de Gainsbourg com arranjos de música árabe, voltar às mesmas canções estava fora do seu pensamento. Até que, numa viagem ao Canadá, comentou com uma amiga que Serge se inspirava frequentemente em temas de compositores clássicos, chegando a usar partes deles nos seus êxitos pop. A sugestão da amiga veio imediata: por que não celebrar esse legado clássico tocando as músicas de Gainsbourg com uma orquestra? O desafio foi aceite e nasceu um concerto, de grande sucesso, com a Orquestra Sinfónica de Montreal.
Daí a ideia de registar o exercício em disco. “Regressei a Serge. Não encontrei ainda melhor”, explicou Birkin recentemente, em declarações ao Le Parisien. Para o disco, foi escolhida a Orquestra da Rádio da Polónia, de Varsóvia. A direcção artística e musical ficou a cargo de Nobuyuki Nakajima, pianista japonês, e de Philippe Lerichomme. Coube a estes, de resto, a escolha do reportório, que não passou necessariamente pelos hits nem sequer pelas músicas originalmente mais orquestrais de Gainsbourg.
O resultado é este Symphonique, que Birkin trouxe este Verão aos jardins da Gulbenkian, como antes já tinha feito com Arabesque, que foi apresentado na Culturgest.
São 21 temas, desde os clássicos “La Javanaise”, “Valse de Melody”, “La Chanson de Prévert” ou “Requiem pour un con” até temas menos conhecidos, como o delicioso “Pull Marine”, oferecido por a Isabel Adjani por Serge, que infelizmente nunca o gravou, e que surge aqui numa versão lindíssima e comovente.
A voz de Birkin está frágil como sempre, ela que sempre cantou naquele falsete que parece ir falhar a qualquer momento, mas agora com toques mais maduros, com mais personalidade.
Symphonique é, acima de tudo, mais uma oportunidade para celebrar o génio inigualado de Gainsbourg, que continua a ser demasiado desconhecido (basta ver que a crítica anglo-saxónica ignorou completamente este disco, enquanto os franceses o celebraram com orgulho).
Gainsbourg, que tinha uma sólida formação clássica, rodeou-se durante a sua vida de arranjadores como Michel Colombier ou o enorme Jean-Claude Vannier, que o ajudaram a dar forma à sua visão de um som total, juntando as altas terras da música clássica à rua plebeia da pop. Este disco traz arranjos novos, por vezes surpreendentes e sempre marcados pelo bom gosto. E tudo, novamente, faz sentido.
Tal como Jane, celebremos Serge. Sempre.