Every Loser é um disco que nos dá um Iggy Pop em grande forma, com canções novas que mostram todas as principais forças da sua carreira.
Aos 75 anos, e depois de já ter feito de tudo e de ter milagrosamente sobrevivido para contar a história, Iggy Pop podia estar a fazer qualquer coisa. Podia estar a jardinar, entre intervalos na meditação; podia estar na hidroginástica para idosos e a jantar às seis da tarde; podia estar a viver de glórias passadas, a gerir catálogo ou a fazer discos de duetos, com arranjos de cordas. Mas decidiu continuar a fazer discos como sempre e, sobretudo, com uma vitalidade que não trai a sua idade.
O álbum de 2023 é Every Loser, o 19º da sua carreira a solo, iniciada em 1977 com o marcante The Idiot. E o que podemos dizer, logo à partida, é que este novo disco é – juntamente com Post-pop depression, de 2016 – dos melhores trabalhos de Pop nas últimas décadas.
Para o montar, o músico juntou-se ao produtor e multi-instrumentista Andy Watt, que ganhou fama sobretudo ao trabalhar em temas de estrelas como Justin Bieber, Dua Lipa, Miley Cirus, Eddie Vedder ou Ozzy Osbourne. Mas Iggy precisava de uma banda, como sempre precisou, toda a vida. Para além de Watt, foram recrutados fãs famosos como o baterista Chad Smith e Josh Klinghoffer, que toca um pouco de tudo. Para além disso, pelo estúdio foram passando e deixando a sua marca nos temas gente tão ilustre como Stone Gossard, Duff McKagan, Dave Navarro ou o falecido Taylor Hawkins.
Com um produtor de êxitos “pop” e tanta gente à mistura, é quase incrível que Every Loser soe a Iggy Pop do início ao fim. Os músicos e colaboradores estão lá para erguer as montanhas sonoras, com inegável qualidade, mas sempre sem pretender ofuscar a verdadeira estrela da companhia.
O disco quase parece um best-of só com músicas inéditas, porque Pop apresenta-nos praticamente todas as facetas da sua mítica personagem pública.
Temos punk-rock feroz logo a abrir, com “Frenzy” ou com as igualmente fortes “Modern Day Ripoff ou “Neopunk” (aqui a gozar com e a imitar os novos punk-poppers); temos o grande single pop-rock de “Strung out Johnny”, com direito a sintetizador e tudo (ainda mais presente na saltitona “Comments”); a balada sentida e profunda de “Morning Show”, uma canção sobre envelhecer e continuar; e o puro e bom rock em “Regency”, entre outros exemplos.
Sendo um disco coeso e com um nível médio bastante alto, destacamos as já mencionadas “Strung out Johnny” e “Morning Show” e ainda “New Atlantis”, uma ode de amor a Miami, que se tornou a casa de Iggy Pop há vários anos. De certa forma está aqui, nesta trilogia, a alma deste disco, e de Iggy aos 75 anos. Um tipo ainda com canções muito boas para escrever e letras que alternam entre o pensamento profundo e o disparate escatológico, mas que nunca nos deixam indiferentes.
Como será ser Iggy Pop, o inventor do punk, o parceiro de Bowie, o inspirador e conspirador rock, como será ser tudo isto no anoitecer da vida? É ouvir este belo disco. Está tudo lá.