Este que viria a ser (pelo menos até agora) o último disco de originais dos Da Weasel foi para mim, na altura, uma experiência inquietante.
Sempre lidei muito mal com beatificações de artistas, bandas, músicas, discos, atores, realizadores, artistas… A lista é infinita. Devido ao meu constante apreço pelos “cinzentos” da vida, extremar uma opinião sobre algo ser o melhor ou o pior sempre me fez confusão, muito porque para existir um extremo, tem de haver outro, que nem sempre é avaliado com justiça ou imparcialidade. Não concordo com verdades absolutas em campos abstratos ou não matemático/científicos e acho que isso me ajuda a avaliar melhor as coisas. Não me deixo toldar a cabeça por modas ou opiniões. Talvez por causa disso não sinto que tenha a veneração quase religiosa pelos Da Weasel (DW) que muita gente tem. Pelo menos era assim que pensava quando comecei a descobri-los.
Lembro-me de ser miúdo e ouvir pela primeira vez, no saudoso Sol Música, algumas canções deles. O videoclip de “Re-Tratamento”, daquele que é um dos meus discos favoritos do grupo (Re-Definições2004), e ficar colado. Que música era esta? O dengoso instrumental e as palavras que a espaços me faziam algum sentido (mas no geral eram uma incógnita). Comprei este disco com o dinheiro ganho num aniversário e ouvia-o num walkman de qualidade duvidosa. “Força (Uma Página de História)”, “Casa – vem fazer de conta” e “Baile (Aquele Beat)” tornaram-se favoritas e sentia que à minha volta ia-se cimentando o mito dos Da Weasel.
Toda a gente falava deles, toda a gente dizia que eram os maiores. Ainda assim, não achava que fossem tudo isso. É certo que havia músicas de que gostava muito, mas outras tantas não conseguia quase fazer passar pelos ouvidos. Aqueles laivos de nu-metal davam cabo de mim e muitas vezes a própria voz de Pacman não fazia qualquer sentido sobre o beat que levava em baixo. Mas depois comecei a ouvir os outros disco e a opinião foi mudando. Podes Fugir Mas Não te Podes Esconder soou-me que nem ginjas quase do início ao fim (mas aquele dub da “Má Situação” destoava aos meus ouvidos). Iniciação a Uma Vida Banal idem, tanto que ainda hoje, recorrentemente, dou por mim a ouvir a “Outro Nível” – e que malha é! Quando já tinha a balança do “amor-ódio” equilibrada para o lado cor-de-rosa, sai o Amor, Escárnio e Maldizer…
Este que viria a ser o último disco de originais dos DW foi para mim, na altura, uma experiência inquietante. Apesar de ser o álbum deles com melhor produção, e de contar com colaborações interessantes (Orquestra Nacional da República Checa, Bernardo Sassetti), estava cheio de momentos “mas que caralho?!” (como o skit com os Gato Fedorento, por exemplo, que até os próprios devem perceber hoje que envelheceu pessimamente). Lembro-me de gostar muito da “Mundos Mudos”, d’ “A palavra” ou até a “Niggaz”. Mas depois havia o resto. A “Toque-Toque”, a “International Love” ou até mesmo o mega hit “Dialectos da Ternura”. O pop tinha-se infiltrado de forma profunda neste conjunto que tinha nascido do underground mais underground que havia. Foi um disco que nunca me pegou, nessa altura. Hoje, a propósito destas palavras, voltei a pegar nele e tudo mudou.
Apesar de continuar a achar a “Dialectos da Ternura”, por exemplo, profundamente oca, consigo afastar-me um pouco mais e ver o horizonte em que este disco se encaixa e o que ele nos diz sobre quem são os Da Weasel. Apesar de ser profundamente mais comercial, este trabalho mostra que eles sempre foram tudo e nada ao mesmo tempo. Esta quase esquizofrenia estilística e sonora, que volta a ir do dub ao rock, passando pelo spoken word e o pop, mostra que os DW foram sempre assim. Uma mistura de várias coisas com muito talento à mistura – a escrita de Pacman e os mixes do Glue sempre foram para mim os maiores destaques neste grupo onde talento não falta – que fugia de qualquer rótulo, criando algo verdadeiramente único. Não havia (nem houve desde então) algo que conseguisse ser minimamente parecido com o que eles faziam. Era nu-metal, a espaços (nem tentem dizer que não, vá), mas também não o era, a espaços. Era rock mas também não o era. Tinha algo de hip-hop – apesar de achar difícil colar-lhes essa definição – mas também não tinha. Era música inteligente e camaleónica.
Hoje continuo a não conseguir alinhar em certezas absolutas, como dizia há umas linhas atrás. Posso continuar a achar que há muita coisa que o DW fizeram que me fazem ter sérias dúvidas do estatuto à prova de bala que ainda têm mas voltar a ouvir este disco, mesmo as faixas que menos gosto, fizeram-me ver que que se ser-se único já é algo notável, sê-lo e ter sucesso é ainda mais raro. Chapeau!