Segunda passagem por Lisboa da turnê “Dois Amigos, Um Século”, depois de em Julho do ano passado terem actuado no EDP Cool Jazz Fest. Felizmente ouviram as minhas preces, já que com muita pena não pude ir nessa altura e agora sim redimi-me, e ainda para mais em sala fechada. Vou começar esta breve partilha de sentimentos sobre o concerto com os aspectos menos bons, para depois, no fim, rematar com tudo o que os faz esquecer.
Ponto 1 – Os preços para estes concertos foram exorbitantes. Não quero entrar em discussões de valer ou não a pena, apenas salientar um facto claro e indizível – não me consigo lembrar de concerto algum com estes preços no coliseu. Mas sim, estava esgotado. Duas noites seguidas. É a crise em Portugal em todo o seu esplendor. E havendo procura, é natural que haja oferta. É pena que assim muitos, principalmente os mais jovens, percam estes momentos históricos da música cantada na nossa língua…
Ponto 2 – A pouca elasticidade do setlist. É um problema comum a vários shows vindos de terras de Vera Cruz, entre cada concerto (dos mais de 40 desta turnê) varia uma música aqui, outra acolá, e nada mais. O concerto é espartano e não prevê lugar ao improviso, à surpresa, quem viu em Julho vê aqui copy paste, com 2/3 retoques. Com um repertório de 50 + 50 anos de música há tanto por onde escolher que me parece um pouco limitador cingirem-se a estas 30 músicas.
Ponto 3 – Aqui e ali problemas de som. À terceira música o microfone de Caetano pura e simplesmente morreu, mais à frente um estouro de alguma ligação mal feita. Na hora andou-se para a frente como se nada fosse e foi melhor assim.
Posto isto, há que dizer com frontalidade – que maravilha inacreditável de concerto. Ter à nossa mercê dois senhores músicos, cantando juntos as músicas da sua vida (e da nossa), como se estivessem na sua sala de estar, bebericando um copo, jingando ao som do parceiro, trocando sorrisos cúmplices é um momento que se guarda para sempre na memória. Do alto dos seus 73 anos, tocam uma música escrita no longíquo ano de 1963 (“É de Manhã”), a primeira escrita por algum deles, para logo depois nos brindarem com a mais recente, escrita o ano passado quando a turnê passou pelo Brasil (“As Camélias do Quilombo do Leblon”). Passam por músicas que fazem parte da História do Brasil (e reparem que não disse história da música) como “Tropicália”, “Domingo no Parque”, fazendo covers e cantando um castelhano límpido em “Tonada de Luna Llena” e “Tres Palabras”, Gil vai ao fundo da questão essencial afirmando de forma clara que “Não Tenho Medo da Morte” (o que num ano que nos tem sido nefasto neste ponto é de saudar), para logo a seguir atirar-nos sambas impossíveis de resistir (que melhor forma para celebrar estar-se vivo?). E no fim, cerejas em cima do bolo – “A luz de tieta” cantada em uníssono com o público e cover de “Three Little Birds”, de Bob Marley. Afinal de contas “Every little thing / is gonna be allright”.
Setlist:
Back in Bahia
Coração vagabundo
Tropicália
Marginália II
É luxo só (João Gilberto cover)
É de manha
As Camélias do Quilombo do Leblon
Sampa
Terra
Nine Out of Ten
Odeio Você
Tonada de Luna Llena (Simón Díaz cover)
Eu vim da Bahia
Super homem
Come prima (Tony Dallara cover)
Esotérico
Tres Palabras (Javier Solís cover)
Drão
Não Tenho Medo da Morte
Expresso 2222
Toda menina baiana
São João xangô menino
Nossa Gente (Avisa Lá)
Andar com fé
Filhos de Gandhi
Encore:
Desde que o samba é samba
Domingo no parque
A luz de tieta
Encore 2:
Leãozinho
Three Little Birds (Bob Marley & The Wailers cover)