Bon Iver regressa depois de cinco anos de espera com um disco agridoce, de canções íntimas e dolorosas, algumas verdadeiramente difíceis de ouvir, a oscilar entre momentos de grandeza e excesso de auto-tune.
Agridoce. Não encontro outra forma de descrever o novo disco de Bon Iver. Em 22, A Million, Justin Vernon traz-nos um trabalho maduro e diferente daquilo a que nos habituou. A última vez que Vernon tinha editado um disco como Bon Iver tinha sido o álbum homónimo de 2011 (depois do portento-surpresa que foi o For Emma, Forever Ago, de 2008) e a espera para os fãs já era longa.
Justin Vernon foi-se dedicando a projetos paralelos, como Volchano Choir (Repave, 2013), o festival de música Eaux Claires ou colaborações – a mais recente no álbum de James Blake. Mas nenhum dos projetos tem a essência de Vernon enquanto Bon Iver e por isso se esperava este disco com tanta antecipação.
E quando 22, A Million chegou, foi agridoce. Umas quantas canções bonitas mas outras difíceis de ouvir, um álbum íntimo e confessional, doloroso. Custou ouvir, foi difícil escrever sobre ele. Como é difícil perceber Bon Iver nas entrelinhas dos efeitos sonoros e do auto-tune, da experimentação, da profusão de instrumentos que por vezes não se conjugam.
O disco arranca com “22 (OVER S??N)”, Bon Iver a dar-nos as boas vindas, lembrando-nos daquilo que fez nos discos anteriores mas já a preparar-nos para as mudanças que aí vêm. Segue-se “10 d E A T h b R E a s T ? ?”, dentro da mesma linha, mais eletrónico mas onde se reconhece Bon Iver.
E eis que, em “715 – CR??KS”, estraga tudo. Auto-tune. Demasiado. A roçar o insuportável (para estes ouvidos que gostam de Bon Iver límpido e quase estridente) – salva-se a letra, bonita e densa, perdida no meio de tanta distorção, no meio do fundo do poço onde Vernon se escondeu para cantar.”21 M??N WATER” é difícil e artificial e “____45_____” segue a mesma linha, experimental mas com pouca coerência.
Destaque para”29 #Strafford APTS”,”33 “GOD”” e também para”8 (circle)”, uma das minhas preferidas do disco, com os sopros, os crescendos, um ligeiro tom épico ainda que melancólico e lento, a voz de Vernon como me lembrava dela. A fechar, “00000 Million” permite fazer umas pazes ligeiras com Vernon, insistindo no auto-tune mas com o piano atrás, lembrando-nos For Emma.
Neste disco já sobra muito pouco do coração partido que se fechou numa cabana no meio da floresta para escrever um disco sobre desgostos de amor. Vernon não quis ser o Bon Iver de sempre. Modernizou-se, mudou, arriscou. Mas no meio da mudança perdeu a simplicidade que o caracterizava, que o tornava diferente, mesmo com a voz em falsete a um nível por vezes insuportável, onde a produção se interligava perfeitamente à voz. Talvez, aqui, se tenha esforçado demasiado para introduzir novos elementos. Talvez seja o novo Bon Iver o que aqui vemos. Agridoce, por vezes incrível e por vezes verdadeiramente insuportável, um Bon Iver que fica indeciso entre manter-se fiel ao que era ou arriscar por novos caminhos.