Menos de um ano depois de Eucalyptus, Avey Tare brinda-nos com um disco mais conciso, temperado com os ingredientes que caracterizam o seu melhor trabalho
>A carreira a solo de Avey Tare sempre foi mais caótica que a do seu parceiro Panda Bear. Sendo que os Animal Collective são o seu foco principal, David Portner raramente nos demonstrou que tinha algo para dizer para além dos discos da banda. Isto reflete-se numa discografia que se divide entre projetos colaborativos (como a seara macia de Pullhair Rubeye, ao lado de Kría Brekkan, ou o caleidoscópio hiperativo dos Slasher Flicks) e discos verdadeiramente a solo (como os pantanosos Down There e Eucalyptus).
Cows on Hourglass Pond parece, pelo menos à superfície, diferente. Há um propósito neste disco que não existira até agora. Mais do que um mero side-project, o disco possui o ethos de um primeiro disco a solo. Algures entre as paisagens ambient subaquáticas de Eucalyptus e o pântano viscoso de Down There, Cows encontra-se sentado à beira rio, ocasionalmente molhando os seus pés na água.
Esta metáfora torna-se clara ao ouvirmos “What’s the Goodside” que, apesar de ter uma batida com um travo a house, contém aqui e ali, salpicos de guitarras reverberantes e vaporosas, numa compota de pop orgânica e experimentação eletrónica (que rendeu deliciosos frutos em Strawberry Jam). Já nesta canção é possível observar uma escolha estética que envolve todo o disco. Num exercício de contenção, Avey guarda para o final de cada música os seus momentos mais delicados.
Liricamente falando, Avey continua o percurso introspetivo que caracteriza muito dos seus discos a solo. As suas preocupações continuam a oscilar entre as responsabilidades da vida adulta e a preservação do meio ambiente, temática muito querida a si e aos seus companheiros de banda. O avanço da tecnologia e a maneira como esta influencia as nossas relações é também um elemento importante do álbum. “K.C. Yours” lida precisamente com a ideia assustadora de um messias robótico, e dá ao disco um dos seus momentos mais orelhudos.
O espectro dos Animal Collective habita Cows sob a forma de pequenas referências à sonoridade que tornou a banda numa das mais influentes da década passada: A bateria em algumas canções remete-nos para os ritmos minimalistas de Feels, as harmonias infantis de “HORS_” lembram aquelas que nos embalaram em Sung Tongs e a componente eletrónica de “Nostalgia in Lemonade” parece ter vinda diretamente do já citado Strawberry Jam.
Com Cows on Hourglass Pond, Avey Tare parece finalmente ter mostrado ao mundo que tinha algo para dizer que não podia dizer ao lado dos seus irmãos musicais., estabelecendo uma identidade cada vez mais distinta daquela que ocupa os discos dos Animal Collective.