O segundo disco dos Allah-Las, Worship the Sun, foi lançado a Setembro deste ano e passou(-nos) relativamente despercebido – o que, atendendo à forma como nos seduziu o primeiro (Allah-Las), indicia qualquer coisa. Não que seja um mau disco, digo-o já.
É verdade que a música dos Allah-Las não é fácil: joga com a contenção, com as sombras e a densidade enevoada dos instrumentos, que se parece voluntariamente distanciar dos rótulos que lhe atiram e dos fenómenos que lhe são contemporâneos (mesmo na música que esses mesmos rótulos parecem abarcar). Do homónimo Allah-Las, em 2012, saía algo que era por aqui descrito como «música de surf semi-depressiva», e que bem colava esse rótulo quando comparado com os outros mais genéricos que a crítica habitualmente lhe dirigia – do surf rock ao garage rock, terrenos muito delimitados para a visão exterior da banda.
Dois anos volvidos, a recepção deste Worship the Sun poderá eventualmente ser ingrata; com algum tempo passado (não muito, mas ainda assim algum) e a surpresa que nos tinha causado o disco de estreia, o sentimento que este novo lançamento me deixa é agridoce: há, enfim, o lado positivo, com momentos nostálgicos como a faixa-título, que me recorda aquelas músicas tristemente coloridas da segunda metade dos 60s, ajustada à marca Allah-Las; as bonitas notas de guitarra ouvidas em «Recurring» quando a preguiça sonhadora se parece eternizar; a singularidade criativa da instrumental «Ferus Gallery» e a portentosa linha de guitarra de «No Werewolf». Mas há também um lado negativo que me ensombra a crítica: a sensação de que este seria o momento ideal para lançar um disco de qualidade altíssima, sem oscilações e com grandes canções, mesmo que não fugindo sobremaneira ao registo dos Allah-Las; e o início do disco, com as três primeiras faixas, torna a audição mais difícil, porque passamos os primeiros oito minutos e qualquer coisa a sentir que já ouvimos isto deles (e, o que adensa a coisa, que já lhes ouvimos isto a ser feito melhor).
«Better than Time» é a canção-chave desta canção: a décima segunda faixa é aquela que nos faz realmente ter pena que todo o disco não se assemelhe a ela: mais polida, com a mesma marca de distância e relaxamento pós-qualquer-coisa, embora com uma melodia intocável, de refrão certeiro e cantável; contudo, além disto, acerto total na criação desse lugar de fuga à vida diária e à música que ouvimos diariamente, que sempre caracterizou os Allah-Las.
Este é, acima de tudo, um disco complicado, com o jogo de expectativas a influenciar na análise de um disco que, por si só, será seguramente bom. E é um disco, é certo, em crescendo. Mas senti sempre que a competência e o impecável bom gosto destes músicos merecia uma maior ambição – talvez na produção, não sei. Até certo ponto, perde-se o sentido de relevância que a estreia prometia; se este é um disco que não tem propriamente tempo e viaja através do passado e da distância, pessoalmente teria sonhado com uma viagem ainda mais conseguida.