O disco que os levou da Austrália para o mundo; e epílogo perfeito da fase Bon Scott. Gajas, copos e rock’n’roll.
Eu primário me confesso: amo os AC/DC. Chamem-lhes brutos, broncos, o que quiserem, mas há mais vitalidade rock’n’roll num só riff seu do que em toda a discografia dos Editors.
Dir-me-ão: têm a sofisticação de um clube de motards em Famões. Responderei: antes isso do que o Nietzsche de wikipédia de muita bandeca indie.
“Mas são misóginos, não falam de outra coisa que não papar gajas.” Por amor de Deus, é o seu universo ficcional, válido como qualquer outro. Porventura o Copolla será mafioso por ter feito “O Padrinho”?
“Ah e tal, mas fazem sempre o mesmo disco e sempre a mesma canção.” Mas é isso que justamente nós, fãs, esperamos dos AC/DC. Não queremos uma fase reggae e uma fase disco e uma fase raios que o parta. Queremos que sejam sempre iguais, monolíticos e previsíveis como o nascer do sol.
“Sim, mas são satânicos e o diabo a sete.” Serenem, minha gente. Nenhum AC/DC vai degolar gatos à meia-noite para o cemitério dos Prazeres. O diabo é uma metáfora de rebeldia, apenas isso. Não há rock’n’roll sem pecado.
Tudo isto para vos falar do seu melhor disco, o blasfemo Highway to Hell. Eddie Kramer entra em campo para dar mais rigor à produção. As mudanças são subtis mas eficazes: backing vocals enfatizadas; jams instrumentais contidas; um polimento final na sonoridade. As rádios deixaram de ter desculpas para os ignorar.
Claro que a produção precisa de nada lhes valeria se as canções não estivessem à altura. Acontece que os AC/DC estão no auge da sua inspiração. O tema-título é imortal, um dos hinos maiores do rock’n’roll. “Girls Gotta Rhythm” tem um groove imparável. “Touch too Much” é, pasme-se, uma canção pop perfeita. Enfim, clássicos em catadupa, uns atrás dos outros. Não fora a esquecível “Love Hungry Man” seria um disco perfeito.
A estética é a de sempre e ainda bem. A secção rítmica é económica e precisa como um pelotão de fuzilamento. Os riffs cúmplices dos irmãos Young tresandam a blues e a gasolina. A guitarra-solo de Angus brinca na areia com malícia. A voz esganiçada de Bon, à beira de se engasgar a qualquer momento, é pura malandrice. Os duplos sentidos marotos são de gosto duvidoso mas há espírito e vivacidade nas palavras de Scott.
Highway to Hell foi o primeiro sucesso global dos AC/DC, vendendo milhões pelo mundo fora. Infelizmente, foi também o último álbum com o carismático Bon Scott. Poucos meses depois, Bon apanharia pela última vez a estrada para o inferno. Dizem que está feliz por lá, mandando piropos às empregadas e pagando rodadas aos amigos.