Pulp fez-nos viajar no tempo e fomos de novo putos. Isso não tem preço. Valeu cada pinga de suor.
Até poderíamos, se quiséssemos, sugerir um novo provérbio: Festival molhado, Festival abençoado, mas talvez não valha a pena. Parece sina. É raro o ano que não aconteça. Já estamos habituados, por isso é melhor guardarmos os lamentos para outras ocasiões e seguirmos em frente.
Último dia, nomes com impacto, mas um houve sobretudo que nos motivou ainda mais. Ver e ouvir os Pulp, a icónica banda do icónico Jarvis Cocker é coisa rara, ainda para mais em terras lusas. Mas não houve Pulp apenas, uma vez que os quase lusitanos The National (o nome parece favorecer a ideia, não é verdade?) também subiram ao palco. No entanto, e em ambos os casos, tudo aconteceria um pouco mais tarde, quando chegasse a noite.
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Durante a tarde, Tiago Bettencourt e os Best Youth abriram os sons do terceiro dia. Ouvimos um pouco de cada um, apenas para que os respetivos registos ficassem nestas linhas. Do primeiro, as sóbrias canções a que nos habituou, poéticas e portadoras de mensagens e causas mais sérias. Dos segundos, importam pouco as letras, uma vez que o mais importante para o duo portuense é abanar o corpo, obrigando-nos a um pezinho de dança. A chuva de ontem, sem granizo e trovões, também marcou presença, pois então.
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Um pouco mais ao lado, já se ouvia o apito dos Expresso Transatlântico. Era apressar o passo para os apanhar mesmo à hora da partida. Chegámos a tempo de “Azul Celeste”, título que parecia irónico face ao chumbo do céu. Os novos Dead Combo, como gostamos de dizer em forma elogiosa para ambos, são extraordinários em palco. Mil vezes ao vivo do que na rodela do CD. Ganham alma, corpo e puxam permanentemente pelo público, apelam à dança e quase nos esquecemos que a água molha, sobretudo quando vinda de cima. E veio. E continuava a vir. “Ressaca Bailada” e “Bombália”, não sabemos se exatamente por essa ordem, são já emblemáticas da carreira recente dos Expresso Transatlântico. E aquela guitarra portuguesa é o link que junta a nossa tradição ao mundo. Sempre ótimos! Muito bons e com muito sangue na guelra.
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Joanna Sternberg veio de guitarra em punho e com algumas canções para distribuir. Temas tristes, a desta cantautora. Como apresentação, talvez sirva bem o facto de ter sido incentivada a escrever canções por Elliott Smith, o que não é coisa pouca. Um pouco mais afastado, mas não o suficiente, ouvíamos o som potente das Mannequin Pussy. Fomos até lá, um pouco para ver se o rock nos salvava, como é costume, mas o que ouvimos foi punk-pop-rock em total entrega, pondo muita gente aos saltos. Como é costume no punk (ou em algum dele) as canções são primárias, diretas, mas sem grande brilho no caso das Mannequin Pussy. Não era exatamente isto o que procurávamos. Voltámos a dar mais um giro. Ainda ouvimos, enquanto nos afastávamos, o pedido que veio do palco: “I want all the boys to shout pussyyyyy”. E, claro, o pedido foi aceite. Teremos sido apenas nós a encontrar semelhanças entre os rostos de Marisa Dabice e Amy Winehouse? Aguardamos respostas.
Uma ou duas palavras para os Shellac, banda fetiche do Primavera desde o início, e que ontem teve direito a uma listening party em honra do mítico Steve Albini. Fãs e apreciadores reuniram-se para ouvirem o último disco por eles gravados, To All Trains. Mas foram poucos. Bonito seria que nas futuras edições do Primavera fosse dado o nome de Steve Albini a um dos palcos do recinto. Quanto ao resto, esteja ele onde estiver, é bem capaz de estar a incendiar de som algum recanto da eternidade. Paz à sua alma.
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Depois, bem… depois foi o fim de uma longa e quase interminável espera de anos e anos, décadas em que queríamos muito assistir a um comeback dos Pulp. E foi perfeito. Entre amigos ainda soube melhor. Suados até às respetivas underwear, e roucos de cantar e abraçar os versos que quase são de uma vida, sentimo-nos genuinamente felizes! Voltámos todos a ser putos de espírito durante quase hora e meia, quando ouvíamos canções como “Disco 2000”, “This is Hardcore”, “ Do You Remember The First Time?”, “Babies” – oh my God, o que nós gostamos da velhinha “Babies” – até tudo explodir com a inevitável “Common People”. Aqueles largos minutos, aquelas palavras cantadas em uníssono por milhares de pessoas… que momento mágico! É tão bom gostar de música e gostar dos músicos que nos são íntimos. É tão bom ver músicos e ouvir músicos que fizeram canções que nos ensinam coisas boas e bons feelings. Que bom que é. E com o concerto dos Pulp foi esse o caso, mesmo quando as menos óbvias “Mis-shapes” ou “Like a Friend” foram ouvidas. O ponto final nessa bela história foi com “Common People”. Se pudéssemos voltar o filme atrás, como se faz nas boxes lá de casa, teríamos sido ainda mais felizes. Mas nada mais importa quando já tudo importou mais do que muito.
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E lá fomos nós, depois de benzidos pelo senhor Jarvis Cocker, ouvir os nossos quase portugueses The National. Até apetece brincar aos slogans e dizer “o que é National é bom”. Na verdade, o concerto de ontem teve óbvios momentos altos, mas competir com O MOMENTO anterior, não é fácil. O mal não é dos americanos, que se apresentaram no palco principal, obviamente. É que para as common people que somos nós, não foi fácil desfazer o cordão sentimental dos Pulp. Mas tudo certo, os National são o que bem conhecemos e isso foi bastando para nos animar. Concerto longo, que agradou ao milhares de fãs presentes. Depois de muitas malhas conhecidas, como “Fake Empire”, por exemplo, o final foi sempre em crescendo, quase culminando com a poderosa “Terrible Love”. O fim teve algum sabor a nostalgia, acalmando os ânimos dos presentes, com “About Today”.
E pronto, about yesterday foi tudo o que tínhamos para vos contar. Restam as despedidas. Adeus, Primavera Sound! Até para o ano.
Fotografias: Hugo Lima – Primavera Sound Porto