Popalhudo mas experimental, festivo mas dissonante, kitsch mas nunca azeiteiro. Um festim de contradições a cores.
O punk teve dois filhos: um arty e sisudo chamado pós-punk (Joy Division, PIL, Gang of Four) e outro divertido e despretensioso chamado new wave (Talking Heads, Blondie, Ian Dury). Não é preciso ser o Nuno Galopim para adivinhar a linhagem dos B-52’s.
A sua obra-prima foi o primeiro álbum, o que é uma maneira simpática de se dizer que a partir daí foi sempre a descer. Mas é um disco tão maravilhoso que redime todas as rodelas assim-assim que fizeram depois.
The B-52’s é uma festa no hospício, uma pista de dança em Marte, uma criança feliz a conduzir o carro do pai em contramão.
Não é fácil transformar a parvoíce em beleza. Yoko Ono tentou e ficou só parva. Screamin’ Jay Hawkins esforçou-se, com os mesmos tristes resultados. Só Little Richard o conseguiu: disse “bop-bopa-lua-whop-bam-boo” e nasceu o rock’n’roll. Ora os B-52’s são os grandes herdeiros do avô Richard. Não são irónicos e pós-modernos, são mesmo parvos, mas de uma parvoíce cool e sofisticada que soa bem. É preciso muito bom-gosto e inteligência para fazer o mau-gosto parvo soar bem.
Os teclados parecem de brincar, comprados na feira. A guitarra é áspera mas divertida. Fred Schneider não canta, vocifera. Cindy e Kate fingem que não sabem cantar mas cantam maravilhosamente bem. E nem precisavam. Serem giras e vintage e loucas já era suficiente.
Os B-52’s são obcecados com a cultura pop anterior aos Beatles, canibalizando tudo: filmes manhosos de ficção científica, penteados parvos em forma de colmeia, a candura um pouco idiota das girl groups à Ronettes, tudo o que tenha algum encanto camp ou série B. O seu grande feito é conseguirem conciliar a sua sensibilidade retro com uma estúpida originalidade.
O seu legado é incalculável. Toda a música que junte loucura, parvoíce e glamour lhes deve alguma coisa. Os Mler If Dada, por exemplo, roubaram-lhes tudo.
Não há disco mais “zuvi zeva novi” do que o primeiro dos B-52’s.