Tocando em Lisboa pela primeira vez desde que voltaram ao ativo, os Stereolab deram um espetáculo generoso de “Space Age Bachelor Pad Music” a um Lux muito agradecido.
Tivemos saudades dos Stereolab. Depois de um hiato de dez anos, a banda, que pode ser considerada uma das mais produtivas dos anos noventa, voltou ao ativo aparecendo em inúmeros festivais, incluindo o Primavera Sound Porto, cuja reportagem fizemos aqui. Uma pandemia depois, foi a vez da capital receber o grupo, com encontro marcado no Lux na passada quinta feira.
A noite começou com um concerto morno de Alberto Montero. Não que houvesse algo de errado na música do valenciano que, munido da sua guitarra acústica, fez o melhor que pode para entreter o público expectante. Mas o tom bucólico da sua música não se adequava em nada à música dos Stereolab. Quarenta e cinco minutos depois, despediu-se e o espetáculo pôde finalmente começar.

Depois de um breve ajuste da maquinaria, Laetitia Sadier anuncia “Neon Beanbag”, uma canção mais loungey do último álbum de estúdio a sério, Chemical Chords. A energia manteve-se a esse nível durante as primeiras músicas que incluiram a faixa-título do EP Low Fi, recentemente resgatado no último volume da série Switched On. Rapidamente surgiu a primeira surpresa da noite: no final dos dezassete gloriosos minutos de “Refractions in the Plastic Pulse” já conseguíamos sentir as nossas solas mais descoladas do chão. As diferentes secções dessa composição demonstram perfeitamente a maestria com que o grupo consegue recriar ao vivo as paisagens sintetizadas que tornam os seus discos tão especiais.
É necessário realçar aqui o trabalho de Joseph Watson e Xavier Muñoz Guimera nos teclados e baixo respetivamente. A transição de “Miss Modular” para o palco, por exemplo, realça a sua groove funky que está mais dissimulada debaixo das camadas de efeitos e sopros da versão de estúdio. “Harmonium”, por sua vez, viu o seu krautrock elevado até ao limite, transformando-se numa avalanche sonora de cada vez que a guitarra entrava. A repetição hipnotizante da música era mais obviamente encarnada pela maneira como Tim Gane abanava a sua cabeça de um lado para o outro de cada vez que um acorde se estendia por mais de dois compassos.
Nesta altura da sua carreira, os Stereolab estão numa posição interessante: impedidos de tocar alguns clássicos devido à morte precoce de Mary Hansen, mas com uma discografia vastíssima, o grupo pode compensar a eventual falta de hits no alinhamento indo buscar ao baú pérolas perdidas e canções de culto. Isto faz com que cada um dos seus concertos se torne uma experiência única onde a maior parte das eras da banda são representadas com pelo menos uma música (de facto, comparando com o alinhamento do concerto Primavera Sound, as únicas canções comuns a ambos são “French Disko” e “Miss Modular”).
Depois de acabarem a parte principal do concerto com versões fiéis de “Pack Yr Romantic Mind” e “Super-Electric” a banda abandonou o palco para nos deixar respirar um bocadinho, antes de nos presentearem com um encore generoso que incluiu “French Disko” tocada com um frenesim que sugeria que a hora de ir deitar se estava a aproximar. O concerto acabou com uma pérola inesperada: “Simple Headphone Mind” (que, tal como Low Fi, só foi recentemente reeditado no quinto volume da série Switched On) é uma música improvável para acabar um concerto, com a sua groove repetitiva e baixa energia. Ao ser usada como introdução a “Excursions Into “Oh, A-Oh””, uma canção igualmente calma, um sentimento de tensão foi surgindo entre o público expectante que foi prontamente abalroado com um reprise de “Harmonium”.
Contando já trinta anos de carreira, com todos os percalços que isso implica, a vitalidade dos Stereolab não esmoreceu e, enquanto esperamos que música nova surja no contexto deste regresso, podemos sempre contar com experiências surpreendentes de uma banda que, no que toca a concertos, está muito perto do seu pico.
Fotografias: Francisco Fidalgo
Alinhamento:
- Neon Beanbag
- Low Fi
- Eye of the Volcano
- Refractions in the Plastic Pulse
- U.H.F. – MFP
- Miss Modular
- Mountain
- Delugeoisie
- Harmonium
- I Feel the Air (of Another Planet)
- Pack Yr Romantic Mind
- Super-Electric
Encore:
- Gus the Mynah Bird
- French Disko
- Simple Headphone Mind/Excursions Into “Oh, A-Oh”/Harmonium