Já passava da meia-noite quando José James entrou em cena. De óculos escuros, era anunciado e surgia em palco perante uma plateia bem longe de estar repleta, mas com algum público presente.
As expectativas estavam altas: apesar de ter recentemente lançado um disco muito distinto do seu anterior e aclamado No Beginning No End, esperava-se um concerto muito especial.
Não se pode dizer, no entanto, que José James tenha estado especialmente bem: e seguramente não esteve ao seu melhor nível. A banda que trouxe consigo encontrava-se desfalcada, e tal foi desde logo notório aos fãs mais atentos: faltava Takuya Kuroda, o trompetista que o tem acompanhado nos concertos e nos discos. A sua ausência acentuou ainda mais a mudança de registo do cantor norte-americano.
José James começou com a música inaugural deste seu último disco, “Angel”, mistura lasciva de soul e R&B com rock. O público recebeu-a bem, ouvindo-se aqui e ali serem entoados os primeiros versos (“Just wanna taste you/Sure you don’t mind”).
Seguiram-se “U R the 1” e “While you were sleeping”, esta última canção-título do seu mais recente álbum, onde José James pega pela primeira vez na guitarra acústica. A canção começou densa e misteriosa até à entrada da guitarra, que em modo blues aguentou os momentos mais monótonos e sofridos da canção.
“Anywhere U Go” surgiu de seguida, naquela que é uma das suas aproximações mais conseguidas ao território rock (apesar da letra ser pouco interessante), ouvindo-se depois “Bodhisattva”, que nos trouxe uma espécie de jam inicial (contida) a pairar entre o rock e o jazz, ligeiramente mais prolongada que na versão estúdio.
Cinco canções tocadas – as cinco primeiras do último disco, tocadas precisamente pela mesma ordem. O público ouvia e interessava-se, mas – talvez por se tratar de músicas recentes – o ambiente estava morno e a noite fria (a excepção foi uma fã a gritar um pedido de casamento, ao qual James, com classe, atirou um “trust me, you would not want that”).
Mas o material recente continuava e José James tocaria ainda as canções 6 e 7 do seu disco mais recente: “24 Noble Truths” e “Dragon” (esta última um dueto algo aborrecido). Só à oitava música José James pegou em material antigo, dedicando “Come to my door” aos fãs que o acompanham há mais tempo: e foi esse verdadeiramente o primeiro grande momento do concerto, com os corpos na plateia a começarem a dançar ao som da guitarra e do baixo, que acompanhavam com groove o registo sentido e baladeiro (mas desta feita não aborrecido) de José James.
Mal “Come to my door” acabara (e em grande) José James lançava aquela que é talvez a sua música mais conhecida: “Trouble”. Cantada do início ao fim na plateia, faltou-lhe apenas instrumentos de sopro que trouxessem (como na versão estúdio) um registo instrumental mais jazzístico a esta grande música.
Ainda se ouviu a excelente Park Bench People, do álbum The Dreamer (2008), prolongada bem para lá da sua duração, com direito a um freestyle que mostrou que José James também tem raízes no hip-hop.
Houve ainda direito a encore, com James a evocar, na descrição da sua excelente canção “Do You Feel”, as lendas Ray Charles e Aretha Franklin, cantando graves belíssimos de quem cresceu a ouvir as lendas certas da música negra norte-americana.
E José James terminava assim em grande um concerto que esteve longe de ser brilhante, mas que – pelo menos – esteve claramente em crescendo. E esteve-o porque foi nas últimas canções que James foi buscar o registo em que é realmente ímpar: o soul americano de raízes profundas, de texturas delicadas e contemporâneas. Poderemos sempre, isso é certo, esperar dele grandes momentos e grandes canções, sobretudo quando deixa o registo mais “roqueiro” de lado e se volta a assemelhar a um dos mais capazes jovens herdeiros da música soul americana.
*Fotos brevemente