Sábado foi a vez de Van Morrison! O EDP Cool Jazz abriu as suas portas para um senhor que tem mais de cinco décadas de carreira e que está mais ativo do que nunca. Foi bom, como se esperava. Mesmo muito bom!
A pouco tempo do fim de mais uma boa temporada de concertos, o EDP Cool Jazz 2018 vai acenando as suas tímidas despedidas. A aposta de o fazer regressar a Cascais terá corrido bem, e os espaços dos concertos pareceram sempre adequados e ajustados aos intervenientes em cartaz. Ontem, o Hipódromo Manuel Possolo recebeu, uma vez mais, casa cheia. Compreende-se bem a razão da enchente, uma vez que a grande estrela da noite há muito que não pisava terras lusas, sabendo-se que por cá (enfim, por todo o mundo) tem um bom e apreciável lote de indefectíveis. Depois do espetáculo de ontem, ficou a faltar apenas mais uma noite de concertos.
A primeira nota não pode ser outra, a de alguma estranheza por começarmos a assistir a um concerto de Van Morrison ainda com muita luz diurna. Pode parecer coisa pouca ou até insignificante (e sê-lo-à para muitos, estamos em crer), mas assistir ao espetáculo de um nome icónico da história da música elétrica dos séculos XX e XXI (blues, jazz, folk, rock e o que mais se sabe) sem que a noite o envolva, é quase um sacrilégio ocular.
Mas passada esta primeira impressão para a escrita, vamos ao que realmente interessa. Ontem foi dia de Van Morrison no EDP Cool Jazz e, portanto, não foi um dia qualquer. O mítico músico apareceu em palco alguns segundos depois da banda iniciar funções e sua figura “à Tony Soprano” fez rebentar as primeiras palmas, embora algo tímidas ainda. O músico irlandês, como sabemos, não tem parado nos últimos tempos (três álbuns em pouco mais de um ano, todos bastante diferentes em estilo e conteúdo) e talvez por isso tenha havido alguma frieza da generalidade do público nos temas iniciais. Mas quem tem o passado deste senhor, tem realmente muito, e por isso, quando tocou “Moondance” e “So What”, a noite, de satisfação, pareceu querer começar a cair mais depressa, ajustando-se ao mood da situação. E, praticamente de seguida, a swingante “Broken Records” prolongou o estado de encantamento.
O seu álbum Versatile esteve em destaque lá mais para o meio do concerto (a belíssima “Bye Bye Blackbird” não podia faltar) e nesse período de tempo, talvez contagiado pelo tom retrô do disco, Van Morrison tocou “Have I Told You Lately” de forma (quase) totalmente irreconhecível, embora com grande brilhantismo. Todo o arranjo é diferente, mas muito bem conseguido.
Outro momento excelente aconteceu com a soberba “Sometimes We Cry”, do distante The Healing Game. Poderosa como poucas! Com “The Party’s Over” voltou ao porto seguro de Versatile.
Claro que “Brown Eyed Girl” não poderia faltar, mas uma vez mais bastante diferente da antiquíssima versão que todos conhecemos. Compreende-se a necessidade das alterações, uma vez que assim, modificados, os temas entram melhor no fio condutor jazzístico do concerto. É, digamos assim, um pequeno sacrifício de ritmos e melodias, tornando-as bem diferentes das originais, para se conseguir assegurar uma linha de conjunto mais coerente para todo o espetáculo.
Já perto do fim, a apoteose de “Glória” fez vibrar todo o público. O antigo tema dos Them foi muito esticado para que se pudesse dar destaque instrumental a alguns membros da banda de Van Morrison, que sorrateiramente foi saindo do palco para já não mais regressar. Queríamos prolongamento, mas a nossa vontade não teve forma de se concretizar. Fica-nos uma certeza: assistimos a um belíssimo concerto e isso já ninguém nos tirará da memória!