
Quando os Beautify Junkyards (BJ) conheceram Nick Garrie em 2012, começou logo a fermentar a ideia de um dia fazerem uma digressão conjunta, casamento mais do que natural entre os revivalistas da folk psicadélica dos anos 60 e 70 e um dos protagonistas da cena original. Volvidos dois anos, o sonho tornou-se realidade e os dois já palmilham a estrada juntos.
Foram os BJ que estrearam o palco do Musicbox, com as canções que já conhecemos do seu álbum de estreia. Todas são covers, algumas de autores relativamente conhecidos como Nick Drake, Donovan, Os Mutantes e Kraftwerk, outras de folkies mais obscuros como Vashti Bunyan, Heron e Bridget St. John. E mais uma vez confirmámos a apreciação que já tínhamos aquando da saída do disco em 2013: a interpretação que fazem destes clássicos é tão pessoal e singular que conquistam por direito próprio a sua quota-parte de co-autoria. A atmosfera bucólica, etérea e outonal que conseguem emprestar a tudo o que tocam é de um bom gosto e de uma sensibilidade absolutamente raras na música pop. Aguardamos com ansiosa expectativa a gravação do segundo álbum, que desta vez contará apenas com temas originais.
Foi depois a vez de Nick Garrie subir o palco, o homem a quem já chamaram «o Rodriguez da folk». Em 1969, Nick gravou um álbum notável – The Nightmare of J.B. Stanislas – que o fez sonhar com o reconhecimento e o sucesso. Mas no preciso momento em que o disco ia ser promovido, dá-se a derrocada da sua obscura editora, na sequência do trágico suicídio do seu presidente. Resultado: o disco não sofreu qualquer promoção, tendo uma distribuição apenas residual. Desgostoso por não ver o seu disco nas lojas, Nick desistiu das suas aspirações musicais, só gravando muitos anos mais tarde, sempre a título amador e ocasional.
Até que em 2005 tudo mudou. Com a passagem do tempo, os raros exemplares existentes do seu disco de estreia adquiriram um verdadeiro estatuto de culto no seio dos aficionados da folk psicadélica, com o seu valor de mercado atingindo somas exorbitantes. Uma editora apercebeu-se do fenómeno, resolvendo reeditar o disco. E é só a partir desta refundação que The Nightmare of J.B. Stanislas encontra o reconhecimento e a aclamação devidas, trinta e cinco anos depois.
É com esta história – quase de conto de fadas – como pano de fundo que acolhemos o regresso do velho bardo. Acompanhado apenas com a sua viola, deleitamo-nos com o seu trabalho de arqueologia, resgate delicado de relíquias por tanto tempo soterradas. Nick é um melodista incrível, pelo que até apreciamos o facto de as orquestrações originais de pop barroco – por vezes, demasiado pesadas – estarem ausentes. Nada assim nos distrai da pureza e doçura daquelas melodias espantosas.
E tudo se harmoniza na perfeição quando os BJ sobem também ao palco, acompanhando Nick no clássico «The Wheel of Fortune». Passado e presente enlaçados no mesmo momento mágico.
Fotos gentilmente cedidas por Lois Gray