Em Dezembro, Pusha T passou pelo Reddit num AMA [Ask Me Anything], e quando questionado em relação às referências na sua música à (enorme) série The Wire, disse que a sua personagem favorita era Marlo Stanfield. E isto é tão verdade, que depois de ouvir King Push: Darkest Before Dawn: The Prelude, comecei a ver o mesmo nível de confiança (no limiar da arrogância) nas palavras de Pusha T que via em Marlo Stanfield.
Há uma nuvem de narcisismo à volta deste trabalho, um sentimento gigante de “eu faço e aconteço”. Se isto fosse The Wire, provavelmente Pusha T já teria sido apanhado por um stick up boy qualquer, porque por muito que Marlo seja a sua personagem favorita, a Pusha T falta-lhe a discrição necessária para o negócio.
Como o que lhe falta em discrição sobra-lhe em basófia, Pusha T canaliza a satisfação que tem com o seu percurso para temas como “Untouchable” ou “Got ‘Em Covered”, onde o dinheiro ganho na indústria ou com droga é agitado bem à nossa frente, onde é a lei do mais esperto que prevalece. Talvez nunca saberemos se há demasiado The Wire nas histórias de Pusha T, ou se afinal estas são efectivamente fiéis aos factos, mas o seu virtuosismo lírico é incontornável, mesmo que o discurso se vá tornando um pouco redundante ao longo do álbum.
E assim se passam dez temas, ou quase, já que “Sunshine” traz de novo para cima da mesa a questão da violência policial, concretamente com o caso de Freddie Gray e as tensas manifestações em Baltimore que se seguiram.
Vale a pena, contudo, olhar para produção deste disco. Naturalmente, e como presidente da GOOD Music de Kanye West, o processo de ter o próprio West, Timbaland ou Boi-1da na produção não deve ter sido de negociação difícil. E o resultado final, tendo em conta a natureza cooperativa do disco, é um pacote heterogéneo de temas que vão dos beats densos e sombrios de “Untouchable” (outra vez) e o sample tão bem metido de The Notorious B.I.G., à reconhecível e sofisticada produção de Timbaland e ao mood mais pop que cria em temas como “Retribution”, muito mais próxima das fileiras da MTV que qualquer outra faixa neste disco. As colaborações parecem minuciosamente escolhidas, e são raros os temas sem hooks viciantes. Oiçam “M.F.T.R.” ou “M.P.A.” e vão perceber do que eu estou a falar.
De título bem explicativo, aguardamos o amanhecer que sucederá a este prelúdio. Nas palavras ambiciosas de Pusha T, fica a ideia de que King Push trará a auto-proclamação do rapper como real hustler no universo do gangsta rap e talvez noutros negócios também. Falamos mais em Abril.