Que surpresa! Este disco já é o terceiro de Paolo Nutini, mas vou considerá-lo o primeiro de uma nova fase.
O escocês já faz música há alguns anos mas, pelo menos por cá, sempre passou meio despercebido. Dos dois primeiros álbuns, lembramos talvez uma ou outra música, mas poucos terão sido os que compraram os discos (These Streets, de 2006 e Sunny Side Up, de 2009). Num registo folk pop que não chega a ofender, também nunca chegou a convencer. Repito, por cá, porque no Reino Unido é um sucesso enorme – os dois primeiros discos venderam, cada um, mais de um milhão e meio de exemplares, e o último tornou-se o disco que vendeu mais em menos tempo – na semana de lançamento, vendeu 109 mil exemplares.
Mas agora, Paolo Nutini mudou o termóstato e, num passo certeiro, deixou a folk e abraçou a soul. Não sei ainda se é o primeiro passo de um caminho que vai prosseguir, mas pelo menos é certeiro.
Primeiro, pela voz dele, rouca, áspera, forte, ideal para cantar soul. Depois, porque a escolha deste caminho, mais próximo da Motown e Stax, não parece ser leviana. Todas as músicas são escritas por Nutini, que assina também, em parceria com Dani Castelar, a produção de todo o disco. Ele controlou o processo do princípio ao fim e parece saber o que está a fazer.
Inspirou-se no R&B e nos clássicos soul – foi inclusivamente buscar alguns, em samples, espalhados nalgumas músicas – e conseguiu em grande parte recriar essa magia, com sopros, cordas, coros e tudo a que temos direito. Do lado mais ritmo’e’blues temos “Diana” e “Fashion”, que tem ainda mais sabor com a participação de Janelle Monáe. A puxar pela alma, temas como “Iron Sky”, “One Day”, “Scream (Funk My Life Up)” ou “Let Me Down Easy” são monumentos de homenagem à tradição que o inspirou, recriada por um escocês de 27 anos. O que isto pode ter de refrescante, também traz um lado perverso, que se revela em “Cherry Blossom” – rock apopalhado sem grande sumo. Felizmente, esta é a única canção do género neste disco, que pelo meio ainda tem dois interlúdios.
A atravessar todo o álbum está, mais fundo ou logo à superfície, o Amor Cáustico que dá nome ao álbum, uma paixão arrebatadora por alguém que terá, por um dia, deixado o sujeito de rastos.