Mulherhomem regressou em 2019 com Blasférmico, terceiro e último trabalho do trio. Um disco que cresce com cada audição.
Nascidos das cinzas do MAR, um dos movimentos de música independente dos anos 2000, Mulherhomem são Luís Balinho, Alexandre Nascimento e Bruno Broa. Uma banda que merece ser ouvida e que agradará a fãs de Royal Blood, Wolfmother e bandas com este tipo de canções cruas, mas também a quem aprecia letras com garra e humor. Dos anteriores, N9vecentos de 2012 e O Inverno dos Outros em 2015, mantém-se o formato de guitarra, voz e bateria. Persiste também o rock cru e agressivo movido por boas letras.
A abordagem directa de Mulherhomem não se desviou passados quatro anos do trabalho anterior. O disco arranca com “É Obsceno”, uma canção com um tema que veremos recorrente, o sexo e amor proibido, quase culpado por existir. Em “Quando te Trato Pelo Nome” surgem imagens de quartos delapidados e desarrumados onde se pergunta “quem comanda afinal a tortura do lençol”. Logo depois, em “Meio Triste Meio Rude”, dá-se o fim dessa luta, com cada um para seu lado. Este é aliás um tema que já tinha surgido em discos anteriores, como por exemplo em “Do Semente” do primeiro álbum.
O disco de 11 músicas tem como particularidade uma canção de 4 segundos, “E o Que lhe Disse Foi” e um instrumental, “Não Te Acendas”, que serve de introdução a “Amanhã Estamos Crus”. Nunca abrandando muito o ritmo nem a intensidade nas canções, Mulherhomem assume-se rock de qualidade e garra. Luís Balinho soa a mais que um guitarrista, alternando facilmente entre ritmos e nunca fazendo sentir a falta de um baixo. As letras de Bruno Broa mantêm a sua qualidade lírica a que já nos habituou em projectos anteriores, Oficina Salobra e Alma Fábrica e a voz, teatral, entre o canto e a declamação. É pena que esta banda nunca tenha furado e chegado a um público mais abrangente mas “o que vem já lá foi” canta-se em “Vítimas Suaves”. O disco termina com “Da Superstição” a maior de todas as faixas de Mulherhomem, uma canção com alguns toques de prog-rock, a apostar fortemente nos efeitos.
Se em N9vecentos a banda ainda procurava o seu espaço entre o rock e o indie, neste trabalho foi ganhando confiança nas composições e sonoridades. Analisando os três lançamentos desta banda, talvez este último trabalho fique atrás do segundo disco, O Inverno Dos Outros, em termos de canções que ficam imediatamente no ouvido. Este Blasférmico é um álbum que cresce com audições repetidas, fazendo-nos descobrir mais detalhes numa musicalidade aparentemente simples.