Os anos 80, em Portugal, trouxeram algumas coisas que se destacaram pela sua originalidade: pensemos em Mão Morta, pensemos em Heróis do Mar, pensemos em António Variações, pensemos em Pop Dell’Arte, pensemos até nos Ena Pá 2000.
Mas, para mim, a banda mais genuinamente original dessa altura foram os Mler ife Dada. Só o nome é um aviso: não venham para aqui à espera do bitoque ou do feijão com arroz. Neste canto da galáxia fazia-se música pop, sim, mas também avant-garde, nova, fresca e trágica. Uma música que ressoava com ecos das artes plásticas, também, algo bastante comum, felizmente, nos anos 80.
Em 1987 sai Coisas que Fascinam, nome espantosamente apropriado para este disco. A banda havia passado por mudanças de membros (uma constante na vida do grupo) mas, nesta altura, estava estabilizada aquela que seria a formação mais marcante. Apesar do entra e sai, os Mler ife Dada eram, sobretudo, duas personagens: Nuno Rebelo, o mentor e fundador e principal ideólogo e compositor; e Anabela Duarte, a vocalista, que emprestou à banda um tom e um carisma que trazia das suas experiências anteriores.
O que temos, em 1987, é um disco inegavelmente pop, mas que tenta a todo o momento ser arty, arrojado, arriscado. E que sai sempre por cima, sendo sempre muito agradável de ouvir.
O disco arranca com o grande sucesso do grupo “Zuvi Zeva Novi”, uma pérola de pop esgroviado que serve lindamente de amostra do espírito dos Mler ife Dada. Depois, temos muita onda Talking Heads, temos Duran Duran se estes alguma vez tivessem tido cérebro, temos um jovem e fresco Rui Reininho a cantar e na direcção de voz, temos baixo vivo e saltitante, e aquela voz fabulosa de Anabela Duarte, que tanto vai ao fado como ao canto lírico, sem nunca perder a graça, ou a garra.
A melhor descrição desta banda é-nos dada pelo próprio Nuno Rebelo, em declarações à última Blitz: “O presente dos Mler ife Dada naquela altura era feito de presente, futuro e passado. Desde música experimental até músicas tradicionais de outros sítios do mundo, o que na altura não se fazia. Éramos eclécticos, a nossa influência era o planeta terra. Música africana, rock and roll, influências do jazz, da música electroacústica, da música improvisada”.
A 14 de Fevereiro, os Mler ife Dada, com Nuno Rebelo e Anabela Duarte ao leme, voltam aos palcos no Centro Cultural de Belém, para dar sequência a uma bela história que até pode, admitem, dar novos frutos no futuro.
Até que se esse momento chegue, o Altamont convida-o a (re)entrar neste excelente ovni da música portuguesa.
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