O décimo-segundo LP de Jorge Palma, Com Todo o Respeito, é o seu disco menos inspirado. Mesmo assim, um punhado de boas canções acaba por salvar a honra do convento.
Algum dia teria de acontecer. Depois de onze belíssimos discos de originais, finalmente chegou o passo em falso. Metade do álbum – e dizêmo-lo com todo o respeito – é competente mas deslavado. Deveríamos, aliás, ter logo suspeitado: quando, numa jogada última de desespero, um artista elege o seu próprio bloqueio criativo como tema – como sucede no single de estreia “Página em Branco” -, a crise de inspiração já vai funda…
O segundo single, “Tudo por um Beijo” – uma encomenda para o filme A Bela e o Papparazzo, de António-Pedro Vasconcelos -, vai pelo mesmo caminho: cumpre mas não impressiona. “A Chuva Cai” ainda engana ao princípio, com um verso promissor, até tudo naufragar num refrão morno e insosso. Nem o outsourcing encomendado a Carlos Tê em “Uma Alma Caridosa” salva coisa alguma, tudo previsível e banal como uma composição de liceu. A produção exemplar de Flak – sempre de um requintado bom gosto – também nada pode fazer para resgatar essas canções da sua intrínseca flacidez. Não nos interpretem mal: se somos impiedosos na crítica é porque amamos Jorge Palma acima de todas as coisas, não estando estas canções à altura do seu santo nome.
E agora que já destilámos toda a bílis da nossa desilusão, vamos às boas notícias: a outra metade do disco é bastante decente. A balada ao piano “A Miúda do Oriente” – orientalizando a questão com as suas brincadeiras pentatónicas – é uma delícia, de longe o tema mais forte do álbum. “Imperdoável” – escrita para a peça “A Balada Margem Sul”, de Hélder Costa – é um clássico instantâneo, parecendo existir desde sempre. O dueto com Cristina Branco, “O Mundo e a Casa”, é irrepreensível, funcionando muito bem o contraste entre a doce bela e o cavernoso monstro. O outro dueto, “Mais um Comboio”, com música de Flak e letra de Palma, é um bocado batota por ter sido reciclado da compilação Espanta Espíritos, de ’95, mas não deixa de ser um saboroso rebuçado pop. A joint venture com José Luís Peixoto, “Pensámos em Nada”, é uma bonita balada folkie. “Agora Não, Ainda Não”, com o acordeão de Gabriel Gomes, tem qualquer coisa de fado, ou será qualquer coisa de tango?, não sabemos bem precisar as nuances da sua melancolia. A canção-título sabe a jazz malandro dos anos 20, Django Reinhardt revisited.
Acima de tudo, Com Todo o Respeito é um disco desequilibrado, onde as canções aprazíveis não chegam para compensar as desenxabidas. Espera-se mais, muito mais, de um disco de Jorge Palma. Imperdoável desaire? Qual quê? Imperdoável é… não perdoar.
Olá
Luísa Coelho