Chegados à última noite do EDP Cool Jazz de 2022, as elevadas expectativas para ver e ouvir Jorge Ben Jor estavam em alta. Não é todos os dias que deuses como este nos fazem uma visita. E foi bom. “Salve Jorge”, nosso “irmão de cor”!
O mais esperado concerto da décima sétima edição do EDP Cool Jazz de 2022 estava agendado para a última noite do Festival. Foi uma espera longa, como longos foram estes recentes anos. Mas valeu a pena, como é óbvio. Não são muitos os concertos do mestre da Música Popular Brasileira, pelo que perder essa oportunidade seria coisa inconcebível. Se é verdade que em 2019 pudemos vê-lo ao vivo, repetir a dose três anos depois era algo que desejávamos muito. E assim foi. Desejo cumprido.
Os concertos começaram ao final da tarde, como sempre. O primeiro foi o de Francisco Gomes Trio (bateria), acompanhado por Tomás Marques (saxofone alto) e Nélson Cascais, no contrabaixo. Como sempre acontece nestas jazz sessions, o ambiente descontraído e relaxante convida à escuta dos que por lá atuam, e há sempre bons proveitos a retirar desses (mais ou menos) quarenta minutos de atuação. Ontem, para não variar, assim foi mais uma vez. É um prazer ver toda esta nova gente promissora. O jazz português tem futuro, isso é coisa certa.
Depois, um pouco mais tarde, por volta das 21 horas, chegou a vez de Jéssica Pina, nome várias vezes presente nas jazz sessions de edições anteriores do EDP Cool Jazz, mas que agora regressa a uma casa que muito fez para a lançar como artista. O estatuto desse regresso é agora bem diferente. Há que lembrar que Jéssica Pina viveu o sonho de integrar, a convite de Madonna, a digressão Madame X World Tour. Com um ep recente em carteira (Vento Novo, de 2021), a compositora e trompetista Jéssica Pina mostrou-nos um pouco do seu novo projeto musical, ao qual juntou a sua própria voz, coisa que nunca antes havia acontecido. Entre outros temas, os mais recentes “What If”, “Drama Queen”, “Romeu” e “Vento Novo” foram tocados em palco, embora não exatamente por esta ordem. E assim, aos poucos mas de forma segura, Jéssica Pina vai trilhando um novo caminho, mostrando as suas raízes (jazz, soul, música de sabor africano) com estilo e arte. Confiança e qualidade não lhe faltam, mas há ainda alguma alma por adquirir. Tudo virá a seu tempo, seguramente.
Jorge Ben Jor entrou a rasgar com a mítica “Jorge da Capadócia” e não mais parou. Festança absoluta, hits de rajada, com algumas desafinações pelo meio, mas isso de nada importou. Estarmos perante uma lenda viva da Música Popular Brasileira faz-nos relevar coisas de importância reduzida. “A Banda do Zé Pretinho” deu origem ao primeiro momento de êxtase, logo ao segundo tema. Até “santa Clara clareou” na noite quente (incrível!) e sem vento (mais incrível ainda!) de Cascais. Tudo para agradar ao mestre Jorge, sem dúvida. Pena que o som não tenha estado nas melhores condições. Na verdade, alguns instrumentos soaram demasiadamente alto, por vezes ao ponto de alguma distorção. Sons indistintos e nada definidos. Uma amálgama quase total. Não se compreende tal coisa, mas aconteceu.
Uma boa surpresa no alinhamento foi o “encaixe” de “A Minha Menina”, tornada mais conhecida pelos icónicos Mutantes. Foi caso para dizer “Que Maravilha”, o tema seguinte apresentado. Como já havia acontecido da última vez que Jorge Ben Jor atuou em Portugal (no NOS Primavera Sound), o músico gosta de misturar e fundir alguns dos seus mais conhecidos temas. Aconteceu, por exemplo, com “Magnólia” e “Ive Brussel”, mas também noutros momentos do espetáculo e com outros temas. A voz de Jorge Ben Jor vai apresentando algumas falhas, mas ainda se vai defendendo como pode, e vai podendo com alguma segurança, mesmo assim.
Outra surpresa foi a inclusão de “Quero Toda Noite”, tema tornado geralmente tocado pelo músico Filipe Galvão, mais conhecido por Fiuk. E, pois claro, “Mas Que Nada” não poderia (nunca!) faltar. Nem “País Tropical”, que quando surgiu no alinhamento, fez-se carnaval no recinto. E com “W / Brasil (Chama o Síndico)” também. Aliás, foi carnaval o concerto inteiro. E como o Brasil é o país dessa louca festa pagã mas também do futebol, “Ponta de Lança Africano (Umbabarauma)” marcou presença em campo. Assim como “Filho Maravilha”, noutro momento em que Cascais se confundiu com o Rio de Janeiro. Poderia ter sido um “gol de placa”, sem espinhas, perfeito, não fosse o som, como já anteriormente referimos. Assim sendo, bateu na barra, mas acabou por entrar, claro. E ganhámos todos.
O concerto foi absolutamente torrencial, sem interrupções entre temas, só ases de trunfos atrás de ases de trunfos, canções maiores do que a vida. “Taj Mahal” foi apenas mais uma, com nova explosão de alegria logo aos primeiros acordes, como seria de esperar. Foi assim até ao derradeiro minuto, e convém perceber que exatamente foram duas horas de concerto. Aos 83 anos é obra. Apetece dize take it easy, my brother Jorge. És enorme!
A noite acabou como havia começado: em festa. “Zumbi” baixou em palco e foi Jorge quem mandou.
*Mais fotos brevemente