Começo por dizer o (quase) óbvio para a esmagadora maioria dos portugueses: a geografia sonora dos amantes da música não vai muito para além do que é feito na Inglaterra, nos Estados Unidos e no Brasil. No entanto, e algo estranhamente, não fazem a menor ideia do que se passa aqui ao lado, na vizinha Espanha. Dirão alguns que essa é ainda uma marca histórica, do tempo em que ambas as nações estavam de costas voltadas. Até pode ser que sim, mas nos tempos que correm é difícil compreender-se muito bem essa grave lacuna, não só pela proximidade física, mas sobretudo pela existência de nomes absolutamente fantásticos, como é o caso do eleito de hoje, e que dá pelo nome de Sr. Chinarro.
Falar de Sr. Chinarro (leia-se Antonio Luque, líder e mentor do projeto) é falar de mais um ilustre desconhecido por terras lusas. Eu próprio, confesso admirador da totalidade do seu trabalho, só o conheci em 2003, aquando de uns preços mínimos da Fnac. Comprei, mais por curiosidade do que por qualquer outra coisa, o disco La Primera Ópera Envasada Al Vacío (Acuarela, 2001), quinto disco da banda, e seguramente um dos menos luminosos trabalhos do projeto. É denso, cinzento, capaz de nos afastar por completo, se não conseguirmos perceber, aos poucos, que há nele algo que nos pode cativar. Depois, um tempo mais tarde, e por gentileza de um amigo de Málaga (curiosamente também portador do apelido Luque), chegou-me às mãos uma cópia de Noséqué-Nosécuántos (Acuarela, 1998), e aí a rendição foi completa. A canção El Idilio, por exemplo, é um instant classic, na sua perfeição veraneante, com direito a modesto coro feminino e palmas a acompanhar. Passava a constatar mais um facto na minha vida de melómano: a indie espanhola era mais um caminho a percorrer.
Desde esse tempo e até agora (estávamos em 2005) fui conseguindo comprar muitos dos seus discos. Já lá vão 10, em 13 trabalhos de longa duração. Assim sendo, e tendo agora um claro conhecimento do conjunto da sua obra, não tenho dúvidas em afirmar que Sr. Chinarro é um dos melhores projetos da música moderna de nuestros hermanos. Por isso, discos como El Porqué de Mis Peinados (Acuarela, 1997), El Mundo Según (Mushroom Pillow, 2006), Ronroneando (Mushroom Pillow, 2008) e El Presidente (Mushroom Pillow, 2011), por exemplo, fazem parte integrante da minha banda sonora, e já há muito que não vivo sem o convívio do sevilhano Sr. Chinarro. Na sua música há ecos longínquos de Echo & The Bunnymen, de The Cure, e até dos The Smiths, mas há também, e sobretudo, um sopro de génio que mereceria ser escutado por toda a gente. Num mundo mais justo, tenho a certeza de que era isso que aconteceria.
Como se não bastasse tudo o que disse, Manuel Luque é um letrista de exceção, um poeta de metáforas subtis e subterrâneas. Ao ouvirmos as suas canções percebemos que Sr. Chinarro não é apenas mais um cantautor (seja lá o que isso quer dizer), e que nele e na sua obra haverá sempre espaço para o refúgio dos dias menos ensolarados. Mas também haverá sempre lugar, assim saibamos encontrá-lo, para nos consolarmos com alguns dos seus trabalhos mais frios e mentais. Depois, e quase terminando estas linhas andaluzes, uma referência à voz de Luque, que alguns poderão não apreciar: é grave, por vezes profunda, e nunca cai no disparate do grito tão marcadamente ao gosto pop, e que tanto se ouve por aí.
Não consigo postar comentários.
Obrigado por incluir a música brasileira entre as três preferências sonoras dos portugueses,o Brasil agradece.
Pos que quereis que os diga, a mi si me gusta, XD. Al Sr carnhrio lo descubri gracias a la critica matadora que le dedicasteis a su ultimo disco, y como en youtube lo que mas se puede encontrar es material de este ultimo y algo de Sr Presidente, pos escucha tras escucha… con sus mas y sus menos… me ha acabado gustando lo suyo, y esta es justo una de mis favoritas. La fase anterior la he oido mas bien poco, pero aun tengo el oido poco acostumbrado a derroteros tan oscuros (la musica es como el arte, a mas escuchas, mas aprecias, pero de buenas a primeras no te intentes meter un picasso que de seguro piensas que es obra de un nif1o)
Nunca tinha sequer ouvido falar, estou a ouvir pela primeira vez. Promete e muito. Obrigado, Carlos.
O homem é mesmo muito bom, Miguel! Thanks e um abraço.