Final de tarde junto ao Tejo e o vento a fazer-se sentir nas irrisórias ondas que agoiravam, desde logo, uma noite tépida, distante daquelas a que tão bem Maio havia habituado Lisboa; no Cais do Sodré, outrora local ancestral de estórias de marujos e meretrizes, apaixonados e decrépitos, respirava-se música e cheiro a lodo.
Num Armazém F à primeira vista tímido e pouco composto, estrearam o palco os lisboetas Katabatic. Ao correrem as primeiras linhas de baixo, um vórtice negro criou-se na sala, engolindo o som da guitarra e sintetizador; o público, tímido em deixar-se envolver na ambiência da sala pouco composta, aceitou finalmente a força centrifuga que se fazia sentir decorrente de um baixo poderosíssimo que fazia esquecer tudo o resto. Uma primeira boa impressão para quem não havia ainda visto a banda ao vivo, como era o meu caso.
Depois de um interregno, God Is An Astronaut sobem ao palco já com uma multidão composta e densa; o ambiente transforma-se: os primeiros acordes são entoados e uma aura melancólica desce à sala, invadindo cada um dos presentes. Pianos e sintetizadores lúgubres alimentam uma melodia ritmada, pronta a eclodir aos primeiros acordes dos irmãos Kinsella, enquanto o público assente efusivamente cada investida do teclista da banda.
Enquanto se dá esta catarse, retorna-se a “The end of the beginning”, primeiro álbum da banda e põe-se prego a fundo em direcção a material mais recente. Como não podia deixar de ser, são tocadas faixas do novo álbum “Helios|Erebus”, mantendo o registo a que a banda nos tem habituado.
As horas passam-se e a energia de ambas as partes envolvidas prevalece nos seus movimentos e expressões. “Is good to be back”, afirma a banda, recebendo em seguida uma significativa ovação do público. Já com o fim à vista, entoam-se acordes de “Butterflies on empty skies”, fazendo lembrar visitas transactas. Já num encore apoteótico, a noite termina ao som de “Suicide by star”, como não poderia deixar de ser. Em suma, um concerto efusivo, marcado pelas composições que se intercalam entre uma lividez incessante e um espasmo de vida. A banda sonora ideal para um apocalipse terreno, desfrutado de forma serena.
Texto: Sebastião Almeida
Fotos: Francisco Fidalgo