A cantiga ainda é uma arma e os Cara de Espelho miram e fazem tiro certeiro nos assuntos relevantes da sociedade portuguesa e não só.
Quando nomes sonantes da música portuguesa se juntam, sabemos que podemos esperar muito dessa união. Dos Cara de Espelho fazem parte: Pedro da Silva Martins (Deolinda), Carlos Guerreiro (Gaiteiros de Lisboa), Nuno Prata (Ornatos Violeta), Luís J. Martins (Deolinda), Sérgio Nascimento (Humanos), Maria Antónia Mendes (A Naifa). Apesar de heterogéneo, o supergrupo casa, numa relação poligâmica, as suas variadas influências musicais de maneira singular, apresentando um dos discos, e projectos, do ano.
As canções do disco Cara de Espelho, todas da responsabilidade de Pedro da Silva Martins, são pequenos (grandes) manifestos daquilo que acontece em Portugal e no mundo, na atualidade.
Em entrevista ao Altamont, o mentor da banda afirmou sobre a necessidade de criar canções de intervenção: “Porque sinto que são necessárias. Sempre escrevi canções sobre os mais variados temas, como o amor, mas vivemos num momento político muito particular, em que é preciso estar mais atento à sociedade.”
A verdade é que o disco conta-nos sobre a política canibal, a sociedade pluralista (acontecimento assustador para tantos “patriotas”), a guerra, a corrupção e até o “Dr. Coisinho”, personificação de tantos episódios putrefactos em Portugal, sempre de maneira poética, não deixando de pôr o dedo na ferida.
O 25 de Abril foi há 50 anos e muitos de nós acreditámos que as canções de intervenção estavam fora de moda e seriam desnecessárias em 2024, mas aqui estamos. Numa época onde assistimos a um retrocesso de valores e um conservadorismo bafiento vindo de várias áreas da sociedade portuguesa, europeia e mundial, por isso afirmo que a cantiga ainda é uma arma, e uma das linguagens mais universais e mais democráticas que existem.
Por isso, as canções dos Cara de Espelho são mais que um exercício artístico e assumem-se como exibições para reflexão. Embora não cheguem a todos, ou aos que deviam mais rapidamente repensar as suas atitudes, ocupam um lugar fundamental na música e na história dos actuais loucos anos 20.