Creio que Amália Rodrigues é uma das poucas intérpretes portuguesas que merece estar lá em cima, no topo, em termos de figuras incontornáveis da música mundial. Para mim, a sua dimensão artística é comparável à de figuras como Ella Fitzgerald ou Maria Callas. Dos nascidos neste cantinho à beira-mar plantado, talvez só Carlos Paredes seja credor do mesmo estatuto, ainda que o mundo não o tenha reconhecido. E é extraordinário que ambos tenham atingido classe mundial sendo profunda e verdadeiramente portugueses.
“Alfama”, lançado um ano depois da Revolução de Abril, é a única prova necessária daquilo que afirmo, e mostra sobejamente a razão de, tantos bons fadistas depois, nenhum ter conseguido suplantar ou sequer aproximar-se da diva do povo que foi Amália.
O tema tem música de Alain Oulman, habitual colaborador musical de Amália, e letra do portentoso Ary dos Santos. Fala de povo, fala de tristeza, fala de miséria. Mas fá-lo de forma tão profundamente humana e solidária que tal só podia resultar das palavras fundas do poeta e da voz universal e portuguesíssima de Amália Rodrigues. Ouça-se esta canção, escute-se com atenção esta letra. Um fado de uma tristeza colossal, um arrepio de levar às lágrimas.
Amália, um povo e um país.