Uma harmónica e uma guitarra em uníssono, um trovar arrastado e grave e uma história que faz qualquer um acreditar que os sonhos não duram para sempre. Uma história contada através de um poema de tal maneira sugestivo que faz com que os lábios tremam e a voz falhe ao tentar entoar os versos. A vida de um jovem de uma vila do interior conservador dos Estados Unidos não era talhada para ser fácil. As saídas eram escassas, muitas vezes o destino era traçado à nascença: “Ah, que rapagão! Vais trabalhar nas obras como o pai” ou “Nasceste numa família de talhantes, não queres fazer o mesmo que o avô e o pai?” O que podia servir como alegria a um jovem que nascesse neste ambiente? Uma paixão por uma Mary de 17 anos que andava na secundária local. Um amor que se torna no único escape de uma vida monótona e sem futuro.
Os apaixonados – como todos os apaixonados – têm os seus locais: um café, um miradouro, uma praia, um jardim ou um recanto que só eles conhecem. Para Mary e o seu namorado, era o rio. Aquela viagem até ao rio e o mergulho nas suas águas são o maior prazer da vida destes jovens amantes. Uma liberdade dos grilhões impostos pela américa conservadora representados por um mergulho que os imerge num amor imenso.
Mas tudo tem um fim. A doce Mary engravida e os jovens têm de casar. A paixão desvanece logo, ainda durante a celebração do casamento, que em vez de ser um momento de alegria se torna numa obrigação, mais um peso a acrescentar à corrente que os impede de voar. Momento tão simbólico do fim que nem fotografias existem. Os tempos passam, o narrador encontra um trabalho na construção, mas os anos da presidência de Jimmy Carter são complicados para a economia e não há trabalho na área. E com esse triste fado da vida adulta, os sonhos esfumam-se e já nem a bela Mary serve de consolo, também ela desiludida com a vida.
O trovador refugia-se na nostalgia: lembra-se da juventude e dos tempos de amor. Os dias em que andavam no carro do irmão, recordando o corpo bronzeado e molhado de Mary, bem como as noites que passaram juntos. Aquelas noites passadas nos bancos do carro em que os braços do cronista envolvem Mary e a puxam para si, só para sentir o seu respirar e todos os movimentos do seu corpo. E se o cenário é idílico, o sonho acaba rápido: “Now those memories come back to haunt me/ They haunt me like a curse”. As memórias do que foi apenas põem em perspectiva a actual situação e o falhanço da vida de quem cana esta história: “Is a dream a lie if it don’t come true/ Or is it something worse?”
E se todo o amor e todos os sonhos têm um fim, ao menos ficam as memórias: os dois apaixonados terão sempre aquelas viagens e mergulhos no rio e o corpo de Mary nunca deixará a memória do cantor.