Ana Frango Elétrico trouxe o fresquinho Me Chama De Gato Que Eu Sou Sua e muita vontade de fazer pessoas dançar para a sua muito aguardada estreia em Lisboa.
Ana Frango Eléctrico é dos mais entusiasmantes nomes da nova música Brasileira, destacando-se não só na música que faz, mas também naquela que produz (por exemplo, o álbum SIM SIM SIM de Bala Desejo ou a estreia homónima de Sophia Chablau e Uma Enorme Perda de Tempo). Depois de Little Electric Chicken Heart, o seu segundo lançamento, ter conquistado os corações tanto da crítica como do público, em 2019, eis que Ana Faria Fainguelernt, ou Ana Frango Elétrico, como é mais conhecida, lançou este ano Me Chama De Gato Que Eu Sou Sua, um disco onde o jazz se funde com uma eletrónica-disco que sabe aos anos setenta, e que, sobre uma estética que nunca deixa de ser um pouco punk, nos fala de amor, de identidade de género, e da agridoce indefinição da juventude. É quase difícil de acreditar que tenhamos tido de esperar até 2023 para ter Ana Frango Elétrico a tocar em Portugal, mas a festa dançante que as canções do seu terceiro álbum criaram no Musicbox deixaram toda a gente certa de que valeu a pena a espera.
Acompanhada pela banda minimalista que escolheu levar consigo na tour europeia, com Guilherme Lírio na guitarra, Sérgio Machado na bateria e Pedro Dantas no baixo, Ana começou o concerto sem perder muito tempo com cumprimentos e formalidades. A ambiental “Let’s Go To Before Again”, cheia de barulhinhos elétricos deliciosos, encheu o Musicbox de suaves “pararás” e deixou logo vislumbrar ao que vínhamos: os músicos traziam vontade de tocar e o concerto seria direto ao assunto, fiel ao disco e, sobretudo, dançante. Seguindo de imediato para “Coisa Maluca”, Ana permaneceu detrás dos seus teclados (como fez, aliás, na maior parte do espetáculo) enquanto punha o público a fazer os coros do refrão. “Boa noite, Lisboa, vamos juntos que com vocês é mais gostoso” – foi o repto da artista, não que fosse preciso instar a audiência a deixar-se levar pelas canções do seu excelente novo álbum, ali tocado quase na íntegra. “Dela” e “Boy of Stranger Things” continuaram a festa e Ana Frango Elétrico agradeceu o carinho, dizendo que era um prazer tocar pela primeira vez em Lisboa (o prazer foi todo nosso Ana). Depois da mais moody “Camelo Azul” e para cantar “Insista em Mim”, Ana abandonou a sua posição e os seus instrumentos e arriscou uma aproximação ao público, o que lhe conferiu uma aura de estilo e confiança enquanto cantava cara a cara com as primeiras filas sobre o seu amor não correspondido.
Mas não foi só de Me Chama De Gato Que Eu Sou Sua que foi composta a estreia em Lisboa de Ana Frango Elétrico. Pedindo, a certa altura, licença para tocar duas canções do disco anterior, Little Electric Chicken Heart, presenteou o público deliciado com “Promessas e Previsões” e a enorme “Chocolate”, ambas recebidas com entusiasmo. “Debaixo do Pano”, estupenda versão de Sophia Chablau, e “Electric Fish” aproximaram-nos do fim do concerto num crescendo de dança e de boas vibrações trocadas entre quem estava dentro e fora de palco. Esta última teve direito a uma versão estendida, com Ana Frango Elétrico a puxar pela plateia para, entre saltos, a acompanharem nos “pararas” finais. A festa acabou em bem com “Mulher Homem Bicho”, single solitário lançado em 2020 que já deixava antever a mudança de direção na música de Ana Frango Elétrico, com um maior foco no amor não binário e em sonoridades mais disco.
Nem sempre os discos que acarinhamos soam como estávamos à espera quando são apresentados ao vivo, mas é um privilégio poder estar presente quando o concerto, não só corresponde, como ultrapassa as nossas expectativas. A vinda de Ana Frango Elétrico a Portugal talvez tenha demorado mais do que nós gostaríamos (e por isso temos de culpar também a pandemia) mas não é descabido dizer que aconteceu na altura certa, a abrir a tour europeia mesmo em cima do lançamento do novo e brilhante álbum, e no local ideal, permitindo proximidade sem perder o ambiente disco que este disco pede. Foi, portanto, deliciosa a festa jazz-disco-punk-chic de Ana Frango Elétrico e companhia no Musicbox. Que não demorem muito a voltar!
Fotografias cedidas por Beatriz Pequeno