Já tínhamos estado à conversa com eles no início do ano, na altura esperávamos para breve o lançamento de um disco que só chegou agora. This Is Los Waves So What? é o álbum de estreia e foi o pretexto para um pequeno-almoço com José Tornada, guitarrista, teclista e vocalista de vez em quando. Como a ocasião é solene – o lançamento do primeiro álbum – quisemos percorrer a história toda de Los Waves, desde o início em que mal sabiam tocar os instrumentos até terem músicas a rodar em séries de horário nobre nos EUA.
ALTAMONT: Comecemos pelo princípio – conta-me a história da banda, dos tempos em que eram os League até ao lançamento deste álbum.
JOSÉ TORNADA: Bom, nós costumamos dizer que este álbum começou a ser feito quando nós tínhamos 15 anos, porque nós – eu e o Jorge [da Fonseca], que somos quem cria e compõe as músicas de Los Waves – começámos a fazer música quando tínhamos 15 anos, quando tínhamos bandas de covers de Nirvana e de Blink 182 e de Offpring, coisas assim, e eu acho que nós tocávamos tão mal que as pessoas que tocavam connosco deixaram de aparecer. E então começámos a mostrar um ao outro coisas que fazíamos em casa e foi aí que comecámos a fazer música – nós temos riffs de guitarra no álbum que foram feitos há uma data de anos, quando tínhamos 16 ou 17 anos – mas depois reparámos que não tínhamos nada para dizer nas nossas letras, porque nunca tínhamos vivido nada, nunca tínhamos tido muitas namoradas nem nada disso, e então decidimos fazer electro, quando o electro rebentou, com Justice e essas coisas. E estivemos a fazer electro durante um ano mas depois pensámos outra vez e vimos que isto não é para nós, temos de voltar à nossa cena onde estávamos, fazer canções tipo pop alternativa, e fizémos os League. Metemos as músicas no Myspace, umas 3 músicas, e recebemos imensos contactos logo, por e-mail, de editoras, agentes, promotores de Londres e então fomos para Londres e ficámos lá dois anos. Depois voltámos, mudámos o nome para Los Waves, lançámos um EP e agora lançamos um álbum. Resumidamente é isso.
E essa por que mudaram de nome?
Porque League era bastante difícil de encontrar na net. Aparecia Champions League, League of Legends, o jogo de computador, apareciam imensas coisas e as pessoas não davam connosco, aparecia mesmo lá para baixo nos resultados, então foi uma questão mais logística do que outra coisa. Ficou mais prático, Los Waves aparece logo.
Como é o vosso processo de composição. Tu e o Jorge escrevem tudo
Normalmente escrevemos as partes individualmente em casa, nós temos gigas e gigas de pastas nos computadores e ficheiros gravados em mp3 que nunca mais acabam. Cada um faz as partes, as melodias de voz, riffs e depois tentamos juntar e é assim que as coisas aparecem. Raramente as coisas aparecem em estúdio ou em ensaio, isso não acontece connosco, é uma produção muito mais caseira e menos orgânica. Só quando estamos a produzir o álbum, em estúdio, é que estamos a experimentar como é que as músicas funcionam em termos de fluência de instrumentos e cadência das coisas. Este é o processo que resulta melhor connosco.
Então não há brainstorming no estúdio?
Quando lá chegamos já vimos em casa aquilo que vamos fazer, já escolhemos as músicas que vamos gravar, porque nós produzimos bastante com os nossos computadores e levamos essas demos e tentamos realmente dar um som melhor, com melhores microfones, com monitores, com um estúdio normal. Por isso as coisas já vão feitas de casa, pegamos sempre naquelas maquetes e depois é só acrescentar.
O núcleo da banda é principalmente tu e o Jorge, mas agora recrutaram um baterista novo – Marco Jung – para integrar esse núcleo, não foi?
Algumas baterias já tinham sido gravadas por ele. Ele só deu ainda um concerto connosco, no Arraial do Técnico, e agora vai fazer parte integrante da banda. Mas é uma pessoa que convive connosco há dois anos, esteve sempre presente na produção do álbum só que nunca nos lembrámos que ele podia vir tocar connosco, só agora é que nos lembrámos. Porque é muito difícil encontrar pessoas para fazer parte duma banda, num sentido mais íntimo. Claro que é fácil arranjar músicos contratados para ir lá tocar, agora pessoas que se vão dar connosco numa base diária e são nossas amigas, e com as quais temos de falar e não vai tudo calado na carrinha, acho que isso é bastante diferente, e acho que nós temos a sorte de ter encontrado duas pessoas que são nossas grandes amigas [Marco Jung e Tiago Ferreira]. Claro que às vezes também vai tudo aos berros a discutir na carrinha, mas faz parte.
Quanto às letras das canções, quem as escreve e sobre o que falam?
É tudo o Jorge que escreve. Acho que as letras se podem dividir em duas categorias diferentes, que também vêm de duas alturas diferentes. O álbum tem músicas mais antigas e outras mais recentes. As mais antigas têm letras que falam de temas mais holísticos, mais universalistas. As músicas mais recentes falam de temas mais humanos, mais de relações. Acho que não existe uma explicação do porquê desta diferença, porque não houve nenhuma tomada de direcção consciente neste aspecto, mas foi assim que acabou por acontecer.
E sobre as vossas inspirações? Acredito que tenham como referência bandas como MGMT ou M83, mais centradas nos teclados, mas depois uma inspiração mais de guitarradas..
As músicas mais antigas têm uma sonoridade mais electróncia e acho que quem tiver acompanhado o nosso percurso é fácil ver que as músicas do álbum, algumas já faziam parte de League, são bastante diferentes das músicas que são totalmente novas. As músicas antigas têm uma influência, na altura da produção, muito mais ligada a MGMT, Tame Impala..M83 por acaso nunca foi uma influência nossa. Nós quando fazemos as músicas, são feitas em guitarra ou em piano e podem levar a direcção que nós quisermos, podem ir para uma onda tipo The Kooks ou The Strokes, ou podem ir para uma cena tipo Tame Impala, sei lá, falando mesmo especificamente de influências. Eu acho que as pessoas normalmente têm problemas em falar destas coisas, de dizer realmente isto. Mas as coisas são como são e acho que uma pessoa, não tendo o conhecimento de produção ou um produtor de topo, tem de realmente pegar em exemplos e tentar, não digo imitar sonoridades, mas digo tentar ir buscar o som “daquela” banda e adaptar ao seu, porque senão as coisas saem…uma “cagada”. Mas, no nosso caso, essas influências e referências aparecem mais na altura da produção e não tanto no songwriting. O songwriting acaba por ser um processo de…possessão, num sentido em que uma pessoa parece que nem controla aquilo que está a dizer e as palavras e as melodias saem da boca e os versos saem das mãos e daquela circunstância toda, e acho que aí não existe tanto essas referências, tão demarcadas.
É um disco soalheiro, de Verão, curiosamente lançado no Outono, na semana que tem mais calor que o Verão verdadeiro. Achas que vocês influenciaram a meteorologia?
Eheheh era bom, assim pediam-nos para lançar discos todas as semanas. Mas é coincidência. Eu não o considero um disco de Verão mas entendo essa analogia e compreendo que as pessoas se sintam bem a ouvir no Verão e que faça lembrar o Verão, ainda por cima chama-se Los Waves, mar, praia, etc. Mas é um cd que é uplifting, mas também tem um carácter diferente, as duas últimas músicas são bastante diferentes, não têm esse ambiente de divertir, são músicas muito mais íntimas, que nós decidimos incluir no álbum. Nós tinhamos cerca de 30 músicas já feitas – nós escrevemos bastante música para televisão e então temos de produzir músicas numa base regular – e acho que o processo mais difícil foi escolher quais é que havíamos de pôr no álbum. E neste caso inserimos essas duas músicas que têm um carácter muito mais íntimo porque achámos que o álbum não podia ser só uma colectânea de singles ou de músicas divertidas, achamos que os álbuns têm de ter substância, conteúdo. Claro que as outras músicas também têm conteúdo, mas acho que tem que haver também essa cadência para um ritmo mais lento, num álbum, senão era sempre a andar.
E o título?
Nós queríamos um título forte para o álbum, um título como costumamos dizer – à inglesa. Há bastantes álbuns ingleses que têm títulos deste género, com afirmações ou perguntas. Também porque o álbum tem uma certa bipolaridade, como falámos, tem músicas mais uplifting, tem músicas mais electrónicas, tem músicas mais rock, tem músicas mais introspectivas, claro que seguem todas a mesma linha, mas em termos da roupagem que nós lhes damos pode ser uma coisa considerada uma coisa um bocado… amadora, porque parece que são pessoas que não conseguiram arranjar um conceito para o álbum. E foi por causa disso que nós também demos esse título. Não como provocação, mas só pela graça.
A vossa experiência em para Londres fez com que a vossa música seja mais “internacional” e não música portuguesa ou nada disso, música é música e ponto final?
Nós não fazemos essa distinção. Eu acho que música é música. O facto de cantarmos em inglês claro que abre mais portas lá para fora, mas também uma banda portuguesa que canta em português também tem as portas abertas lá fora e pode ser considerada uma banda internacional. Há bastantes exemplos disso. Eu nunca pensei nisso da banda portuguesa ou internacional, nós simplesmente fazemos música e vamos pelos caminhos que nos são naturais – foi natural para nós ir para Londres, foi natural ter começado lá, aliás foi das coisas mais importantes que nos aconteceu, porque fez com que amadurecêssemos enquanto banda, enquanto pessoas, passámos bastantes dificuldades, o que também foi bom, fez-nos andar para a frente enquanto músicos e realmente foi aí que sentimos que íamos começar uma carreira. Porque nós nunca tínhamos dado concertos, só tínhamos dado um a tocar covers de Nirvana. E quando chegámos a Londres, passado uma ou duas semanas estávamos a dar o primeiro concerto.
Também tiveram algumas músicas em séries americanas, como foi isso?
Essa oportunidade só aconteceu porque estávamos em Londres, foi num concerto, tivemos a sorte de estar lá um programador de música de Hollywood, ele gostou bastante das nossas música, embebedámo-nos com ele, e ele quis levar a nossa música. Fez mil cópias e começou a distribuí-las pelos programadores de música das séries e filmes. E foi aí que isto começou a acontecer, quase de duas em duas semanas aparecemos numa série nova. Nós não gostamos muito de publicitar isso porque normalmente são coisas que nós não sabemos o que são, ou são séries da MTV sobre miúdas que estão grávidas com 16 anos, ou coisas desse género, que nós não fazemos ideia. Nós não vemos séries, mas conhecemos, sabemos o que é as “Mentes Criminosas” ou “Gossip Girl”. Mas nós também saímos em muitas séries a que nós não ligamos nenhuma. Mas sim, claro que é bom sair em séries, não é uma coisa comum nas bandas portuguesas, mas para uma banda que está em Londres é relativamente normal, porque as séries precisam de música e tem que haver suply. Mas claro que é bom, é óptimo, primeiro porque é uma fonte de rendimento, e porque as pessoas, principalmente lá fora, vêm as séries e vão à procura das músicas, a acabam por nos seguir no Facebook ou assim.
E agora vem a parte de tocar ao vivo?
Nós quando estávamos em Londres demos cerca de 20 concertos, depois viemos para Portugal e estivemos uns 8 meses sem tocar. Depois fomos contactados pelo Henrique Amaro, que nos abriu portas da Optimus Discos para lançar o primeiro EP, de League na altura. Depois disso já demos alguns concertos, e agora a apresentação oficial vai ser no dia 13 de Novembro no Sabotage em Lisboa, no Porto dia 14 no Maus Hábitos e dia 15 em Leiria, no Texas Bar.
Estes serão os primeiros concertos já com o disco lançado, acredito que já haja uma reacção diferente do público.
Sim, penso que sim. Nós, há alguns meses, nos últimos 6 ou 7 concertos já andámos a tocar bastantes músicas do álbum, também para o testar ao vivo e para ganhar a fluência necessária para o tocar e, na altura, para o acabar de gravar. A reacção das pessoas foi bastante boa, havia músicas que as pessoas não conheciam de lado nenhum e no final vinham pedir a setlist porque queriam saber o nome de uma ou outra música, mas elas ainda não estavam editadas. Mas a principal diferença de agora em diante vai ser o facto de termos baterista, que nós na altura não tinhamos baterista, tinhamos backing track a tocar no fundo e tocávamos por cima, quase como se estivéssemos a gravar um álbum ao vivo. Tinha uma sonoridade bastante diferente do que vai soar agora, como é óbvio, porque com bateria as coisas são muito mais orgânicas e muito mais reais. Por isso acho que vai ser bastante bom e nós estamos a gostar bastante de tocar com baterista porque não temos de estar preocupados com o tempo da música e com enganarmo-nos, porque se estamos a tocar com backing track, se nos enganamos, já não há volta a dar. Agora com baterista é muito mais fluído e sentimos muito uma coisa muito mais musical, e está a ser bastante bom para nós porque estamos a conseguir desenvolver capacidades de músicos que não conseguiríamos se estivéssemos a tocar com backing track.
E como é que vocês soam ao vivo?
As bandas nunca soam ao vivo como soam no álbum. Claro que não existe uma discrepância enorme, dá para perceber que são as mesmas músicas e têm as mesmas texturas e tentamos meter o máximo de coisas possíveis. Mas por só sermos 4 às vezes dificulta um bocado o processo, usamos bastantes texturas de fundo que ajudam a dar o ambiente da música, que ajudam a dar o ambiente da música, porque senão as coisas acabavam só por soar a um rock cru. Não que tenhamos algum problema com isso, nós temos músicas mesmo de rock cru e que ao vivo são as que resultam melhor. Acho que o facto de termos virado mais para uma cena de rock cru partiu dos concertos ao vivo, porque ao início éramos bastante mais electrónicos, muito mais à base de sintetizadores, de beats, quase de discoteca, e começámos a reparar que as pessoas reagiam muito melhor ao rock e foi a partir daí que começámos a pensar que se calhar o rock era um estilo ao qual nós pertencíamos, no sentido em que era fácil para nós, gostamos, e ao vivo resultava melhor.
E o futuro? Não querendo estar a pôr a carroça à frente dos bois, mas hão de querer ficar a fazer música durante largos anos?
Sim, sem dúvida. Nós não temos mais nenhum trabalho, vivemos todos exlusivamente da música (tirando o nosso baixista que também é padeiro). E acho que isso é essencial, claro que não temos uma qualidade de vida brutal, mas é essencial estar com a cabeça totalmente disponível para fazer música. E se não houver isso, ou alguma coisa perto disso, nunca se vai conseguir fazer uma carreira de mais do que um álbum ou dois, e o nosso objectivo é fazer mais álbuns, continuar a fazer músicas, continuar a tocar, fazer tours lá fora e…sim, os nossos planos passam por continuar com força. Mas é cedo para estar a falar de um segundo álbum para já, nós temos muitas músicas feitas, não sabemos se vamos usar alguma delas…não sei dizer.